Ao descobrir TEA da filha, secretária executiva cria rede de apoio para mães de autistas no Acre

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Programa começou através de grupo de mensagens e se tornou um projeto de extensão na Universidade Federal do Acre (Ufac). A criadora, Mirza Costa, conta que se inspirou na própria dificuldade em encontrar apoio ao cuidar da filha autista para criar o grupo. Iniciativa começou como grupo de mensagens e se tornou projeto de extensão
Reprodução
Em 2020, em meio à pandemia de Covid-19, a secretária executiva Mirza Costa lidava com a recém descoberta do diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) da filha Maria Luisa, hoje com 6 anos. Desde então, ela buscava formas de se habilitar e aplicar intervenções por conta própria que pudessem ajudar no desenvolvimento da filha.
Ela conta que o processo foi complicado e a menina teve o diagnóstico invalidado diversas vezes. Por conta da dificuldade em obter assistência de provedores particulares de saúde, ela precisou buscar medidas judiciais.
“Aos 2 meses de vida [de Maria Luisa] desconfiei do TEA. Aos 11 meses, levei a primeira vez em neuropediatra. Exato 1 ano depois, levei em outra e iniciamos a investigação neuropsicológica sob a hipótese diagnóstica de TEA. Iniciei intervenção precoce sozinha, estudando sozinha, processando o plano de saúde para que oferecesse as terapias conforme laudo médico”, relata.
Inspirada na própria trajetória de “mãe atípica”, como ela se classifica, Mirza decidiu criar um grupo para auxiliar e orientar mães e famílias que passavam por dificuldades semelhantes. Foi aí que surgiu um grupo de mensagens que reuniu participantes do Acre e de outros locais.
“Em 2020, criei um grupo de Whatsapp que contou com mães acreanas, mas também de todo o Brasil. Além de brasileiras que moravam nos EUA, Europa, etc. O grupo girava em torno de 200 participantes. Haviam alguns pais e alguns avós com a guarda da pessoa com autismo. Transformei meu Instagram pessoal em @maepeutadoacre e iniciei com enquetes semanais, lives aos sábados, posts de temas relevantes para nós e dividindo minhas experiências de aplicação de programas e do meu dia-a-dia com a Malu”, explica.
Mirza criou rede de apoio após passar por dificuldades no atendimento à filha Maria Luisa
Arquivo pessoal
Mãepeutas do Acre
Conforme o crescimento do grupo, Mirza começou a agregar palestras e encontros com especialistas da área, e continuou os próprios estudos. Agora, o grupo se tornou um projeto de extensão na Universidade Federal do Acre (Ufac).
Com o fim das restrições do período pandêmico, as atividades do projeto passaram a ser feitas presencialmente. As três principais atividades do programa são o Papo de Mãepeuta, que ocorre por meio de lives; Mãepeutas Autocuidado, que é dedicado à saúde mental das mães e participantes; e Práticas Baseadas em Evidências nas escolas de Rio Branco, que abrange mães e estudantes.
Atividades do projeto “Mãepeutas” variam entre palestras, rodas de conversa e oferta de serviços
Arquivo pessoal
“Não é um grupo terapêutico. Às vezes, temos a presença de um profissional da área da saúde, às vezes é o uso da oferta de um serviço, às vezes é uma roda de conversa ou palestra, depende da escolha e do tema”, diz.
Atualmente, Mirza cursa pós-graduação em ABA (Análise do Comportamento Aplicada), e atua como assistente terapêutica domiciliar e escolar e aplicadora supervisionada.
“É inevitável militar e lutar pelos direitos dos nossos filhos. Não dá pra escolher. Como também não deu pra escolher, com tanta invalidação, não estudar e não me profissionalizar para auxiliar a minha filha no seu autismo”, relata.
Persistência
Rauana, que tem TEA, diz que evolui junto com a filha, que também recebeu o diagnóstico
Arquivo pessoal
Uma das participantes do programa, Rauana Batalha diz que a principal contribuição do grupo é no acesso a informações que muitas vezes são repassadas com linguagem técnica, o que dificulta o entendimento de orientações importantes.
Além de mãe, ela também tem diagnóstico de TEA, e ressalta que as informações sobre o espectro têm sido mais amplamente divulgadas, o que pode auxiliar pessoas com trajetória semelhante à dela.
“Quando uma mãe explica pra outra a gente procura chegar a um a jeito mais simples, mais fácil de que todo mundo entenda. Acredito que atualmente tem sido um pouco mais fácil, entre aspas, a gente conseguir o diagnóstico de TEA, no sentido que a informação tem sido amplamente divulgada. No entanto, o que trava é o sistema porque existem poucos especialistas, e a maioria das pessoas, principalmente de renda menor, não têm acesso a esse profissional. Então o que complica é esse sistema. Mas em termos de informação tem sido um pouco mais tranquilo você conseguir o diagnóstico do que há dez anos, por exemplo, que havia muito menos informação sobre o TEA”, avalia.
Para quem ainda está iniciando tratamentos ou a busca por diagnóstico de TEA, Rauana deixa um recado: persistência. Ela destaca que apressar os processos pode ser prejudicial, por isso a importância de uma rede de apoio.
“Também cheguei ao meu diagnóstico e também tenho feito tratamento. Então, melhorou muito para nós duas nesse aspecto. Embora as dificuldades do sistema. Às vezes tem alguma dificuldade na escola, com plano de saúde, etc. Mas a gente tem caminhos. Não desistam. Não é uma corrida de velocidade, é uma maratona. A gente vive um dia de cada vez e com esperança, porque a gente colhe resultados, eu acredito nisso. Se a gente tiver fé, persistência, procurar aprender, procurar uma rede de apoio, a gente consegue muita muitas coisas que às vezes até parecem impossíveis, mas elas são sim possíveis”, conclui.
Esclarecimento
E é com esse intuito que Mirza segue com o projeto Mãepeutas. Além do ativismo, ela diz que o principal objetivo do grupo é compartilhar informações, e auxiliar nesse processo que costuma ser desgastante.
Para Mirza, é gratificante ver as mães buscando também as qualificações acadêmicas para contribuir com o tratamento dos filhos, e apoiá-las durante as experiências semelhantes à que ela teve.
“No retorno de contribuição às vidas, há um impacto direto e aquela mãe jamais será enganada. Elas se esclarecem, muitas fazem faculdade e pós por causa das nossas orientações, e quando sentindo na pele o que senti no passado, vão se dando conta de que o que falamos não é exagero e sim a realidade do nosso estado. Recebo sempre depoimentos e agradecimentos”, conclui.
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