Desmatamento e crimes ambientais pressionam entorno e novas terras indígenas demarcadas; veja raio-X

desmatamento-e-crimes-ambientais-pressionam-entorno-e-novas-terras-indigenas-demarcadas;-veja-raio-x


Análises do WWF e do Mapbiomas revelam como o desmate atingiu os novos territórios homologados. A demarcação de seis terras indígenas pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), anunciada no final de abril, representa uma retomada de uma das ferramentas da política indigenista do Brasil.
As homologações foram as primeiras desde 2018 e ajudam a garantir uma segurança jurídica e física para os povos indígenas, que por sua vez retribuem com a proteção da floresta e impedem o avanço do desmatamento nessas áreas, principalmente no bioma da amazônico.
Por isso, especialistas afirmam que processos de demarcação são também um verdadeiro mecanismo de conservação de baixo custo que trazem à tona a importância da preservação da biodiversidade desses ecossistemas.
Mas o que se vê na maior parte das novas TIs demarcadas é uma outra realidade. Dados da plataforma Terrabrasilis, desenvolvida pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), escancaram o desafio dessa preservação ao revelar que 5 desses 6 territórios atualmente sofrem pressão do desmatamento: são eles Arara do Rio Amônia (AC), Avá-Canoeiro (GO), Rio dos Índios (RS), Kariri-Xocó (AL) e Tremembé da Barra do Mundaú (CE).
As análises foram feitas pela ONG WWF Brasil, a pedido do g1. O Mapbiomas também forneceu algumas imagens de satélite.
A reportagem também entrou em contato com o Ministério dos Povos Indígenas, questionando quais políticas públicas deverão ser articuladas para a preservação desses territórios, mas não obteve resposta a última atualização desta nota.
1. Arara do Rio Amônia
Localização: Marechal Thaumaturgo (AC)
Bioma: Amazônia
A Terra Indígena Arara do Rio Amônia, localizada no Acre, enfrenta um cenário preocupante devido à entrada de atividades ilegais em seu território.
Daniel Silva, especialista em Conservação do WWF-Brasil explica que apesar da pressão por desmatamento ter diminuído no entorno da região ao longo dos últimos anos, a TI agora vem sendo utilizada principalmente como rota fluvial para tráfico de madeira e drogas, já que o território é cortado pelo rio Amônia.
Na imagem abaixo é possível observar exatamente esse percurso, destacado pelas faixas mais amarelas cortadas pelo desmatamento.
Contudo, Silva ressalta que grande parte do desmate na Arara do Rio Amônia ocorreu antes de 2007 (cerca de 10km²), e que agora tanto o entorno quanto o interior da TI mantêm níveis similares de preservação.
TI Arara do Rio Amônia
WWF
Apesar disso, o pesquisador afirma que a TI está atualmente em risco, uma vez que essa entrada ilegal já está consolidada.
Segundo os dados coletados pelo WWF, ao longo dos últimos 20 anos, o desmatamento dentro da TI acumulou cerca de 12 km². Já a taxa no entorno (chamada de buffer) atingiu 10 km².
Nessa imagem de satélite abaixo de alta resolução, divulgada pelo Mapbiomas, também é possível ver essas marcas do desmatamento dentro e fora do território, em tons em verde claro que mostram o contraste com a vegetação preservada.
TI Arara do Rio Amônia
Planet/Imazon
2. Uneiuxi
Localização: Santa Isabel do Rio Negro e Japurá (AM)
Bioma: Amazônia
A Terra Indígena Uneiuxi é uma área protegida localizada no estado do Amazonas.
No caso dessa TI, na análise, o WWF considerou os limites estipulados para a terra indígena antes da homologação.
Os dados mostram que a região não sofreu grandes impactos de desmatamento nos últimos anos, tanto dentro dos limites da TI quanto em sua área de entorno. Também de acordo com a análise do WWF, desde 2007 o desmatamento dentro da TI acumulou cerca de 0,56 km², uma taxa menor que os 2,65 km² no seu entorno.
Longe da frente de desmatamento no estado, Daniel enfatiza que a TI apresenta um potencial de conservação para possíveis futuras pressões.
TI Uneiuxi.
WWF
“Se houver política ambiental adequada, a demarcação de TI é um instrumento de conservação de baixo custo,” diz.
No entanto, ele lembra que a simples demarcação e homologação das Terras Indígenas não é suficiente; é necessário que o Estado atue efetivamente nesses territórios e faça cumprir a lei.
“O Caso dos Yanomamis ilustra as consequências da ausência das autoridades públicas. A destruição disparou com a invasão de 20 mil garimpeiros ocasionando muitos casos de mortes, seja pela malária, subnutrição e, diretamente pela exploração dos povos indígenas”, relembra.
Nessa outra imagem de satélite de alta resolução fornecida pelo Mapbiomas também é possível ver a preservação da floresta dentro e no entorno do território: a foto mostra uma ausência de tons em verde claro, que indicam o desmate.
TI Uneiuxi.
Planet/Imazon
3. Avá-Canoeiro
Localização: Minaçu e Colinas do Sul (GO)
Bioma: Cerrado
A Terra Indígena Avá-Canoeiro está localizada no estado de Goiás. No caso desse território, a análise mostra que principalmente seu entorno tem sofrido pressão por desmatamento, mas que a TI ainda está relativamente bem preservada, com apenas algumas entradas no leste e nordeste.
Porém, o desmatamento recente tem sido substancial na área ao redor da TI, com mais de um terço ocorrendo a partir de 2015. Isso sugere que a TI também está sob risco atualmente, apesar de ter um histórico recente de um índice baixo de desmatamento em seu interior.
Segundo os dados apurados pelo WWF, ao longo dos últimos 20 anos, o desmatamento dentro da TI acumulou cerca de 2 km². Já a taxa no entorno atingiu 27 km².
Apesar dessas ameaças, a Terra Indígena Avá-Canoeiro ainda apresenta um potencial significativo de conservação, avalia Daniel.
TI Avá-Canoeiro.
WWF
4. Rio dos Índios
Localização: Vicente Dutra (RS)
Bioma: Mata Atlântica
Aqui, a análise do WWF mostra que a Terra Indígena tem sido alvo de um desmatamento intenso e antigo, tanto em seu interior quanto em seu entorno. Em 2000, a TI já apresentava um desmatamento significativo de 6,17 km², enquanto o entorno registrava uma área desmatada de 13,04 km².
Na imagem abaixo não dá para ver (a área perdida até 2000 não aparece preenchida), mas o total acumulado de desmate dentro da TI é ainda mais significativo, chegando a 7,12 km² ao longo de duas décadas, mais de 99% da área do território. No entorno, a taxa chega a 13 km².
Por isso, Daniel diz que “sobrou quase nada” da vegetação nativa da área, o que sugere que a região sofreu graves impactos ambientais e uma perda significativa de sua biodiversidade. Apesar disso, na visão dele, a TI ainda pode apresentar um potencial de restauração desses ecossistemas, desde que haja uma ação efetiva de proteção ambiental e recuperação dos danos.
TI Rio dos Índios
WWF
5. Kariri-Xocó
Localização: Porto Real do Colégio e São Brás (AL)
Bioma: Mata Atlântica
Aqui a situação também é semelhante: a área da TI está quase totalmente desmatada (embora a área perdida até 2000 não apareça preenchida), assim como o seu entorno. E o desmatamento também é antigo.
Também no caso dessa TI, na análise o WWF considerou os limites estipulados para esta terra indígena antes da homologação.
Dentro da Kariri-Xocó, o desmatamento acumulado nesses 20 anos representa cerca de 84% do total da área protegida: 5.72 km². No entorno, a taxa foi cerca de 9 km² (88% do buffer).
TI Kariri-Xocó.
WWF
6. Tremembé da Barra do Mundaú
Localização: Itapipoca (CE)
Bioma: Mata Atlântica
A região ocupada pelos Tremembé da Barra do Mundaú não possui muita vegetação: grande parte do local é ocupada por dunas. Mas tanto dentro da Terra Indígena quanto no entorno, o desmatamento foi bastante expressivo nos últimos anos.
No seu interior já foram desmatados mais de 14 km² (42% de sua área). Já no seu entorno (a faixa buffer, em roxo), cerca de 9 km² (28%).
No entanto, apesar desse cenário, a TI possui um grande potencial de restauração dos ecossistemas.
Novamente, Daniel ressalta que com medidas efetivas de proteção e recuperação ambiental, é possível recuperar parte da biodiversidade perdida e garantir a conservação da área.
TI Tremembé da Barra do Mundaú
WWF

Adicionar aos favoritos o Link permanente.