Opinião: Turquia de Erdogan é desafio a pesquisas de opinião

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Nem a desastrosa gestão do terremoto nem a crise econômica no país abalaram o apoio eleitoral ao presidente turco. Após uma campanha questionável, muitos estão certos de que ele se manterá no poder, opina Erkan Arikan.Após mais de 20 anos de domínio de Recep Tayyip Erdogan e seu Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), a troca de poder na Turquia em favor da oposição parecia mais provável do que nunca, com a eleição deste domingo (14/05). Mas as coisas nunca acontecem como se pensa, pois só um segundo turno decidirá quem vai ser o próximo presidente da república.

Erdogan governa de forma cada vez mais autocrática, porém sua imagem está balançada, a desoladora situação econômica provoca insatisfação compreensível entre a população. Mas como a oposição não conseguiu maioria, será preciso esperar 14 dias pela batalha final entre o atual presidente e seu desafiante, Kemal Kilicdaroglu.

Já passa bastante da meia-noite na central do AKP. Desde o começo da noite, os adeptos de Erdogan se reuniram lá para festejar uma vitória de seu “reis” (seu capitão). Mas ele deixa que esperem por ele, ainda não há um resultado válido. Quem está na dianteira? Quem será o novo chefe de Estado? Os monstruosos alto-falantes rugem sem cessar: “Recep Tayyip Erdogan, Recep Tayyip Erdogan – nosso presidente!”

A crer nas consultas populares, o oposicionista Kemal Kilicdaroglu deveria ter vencido neste domingo. “Não acredite em nenhum instituto de pesquisa de opinião”, adverte nosso motorista, Sedat, que depois da uma hora da manhã nos leva da central do AKP para o hotel.

“Ninguém nessas firmas diz a verdade. No segundo turno, Erdogan é quem vai vencer, Kilicdaroglu é o perdedor”, afirma, com grande desapontamento no rosto. “Nossa gente tem medo de dizer honestamente em quem vota, porque no dia seguinte a polícia pode estar batendo à porta.”

Avanço dos nacionalistas nas costas dos refugiados

Naturalmente, muitos se perguntam agora como se chegou a esse resultado. Os poucos votos do Iyi, o Partido do Bem, de Kilicdaroglu, de cunho nacionalista, não bastarão para elegê-lo.

Além disso, o pró-curdo Partido Democrático dos Povos (HDP) ficou abaixo de 10%, possivelmente por não ter apresentado um candidato presidencial próprio, como fizera no último pleito. O apoio aberto da sigla a Kilicdaroglu também desagradou muitos curdos, e a consequência foi parte dos eleitores HDP não ir às urnas.

A campanha eleitoral, que também foi travada às custas dos refugiados na Turquia, favoreceu a ala dos nacionalistas. Ao contrário dos prognósticos, que conferiam ao grupo menos de 1% dos votos, o candidato nacionalista Sinan Ogan saiu acima de 5%. E seu – na verdade ultranacionalista de extrema direita – Partido de Ação Nacionalista (MHP) obteve 10%, quando nas enquetes se arrastava lá pelos 7%.

A firme intenção de enviar o máximo possível de refugiados de volta a seus países de origem conquistou o eleitorado turco. Mas não é só: justamente da ala do presidente manifestou-se com frequência uma linguagem de violência, ameaças e agressão.

E se há algo que Erdogan sabe fazer bem, é demonizar seus adversários políticos. Segundo ele, Kilicdaroglu receberia instruções do Partidos dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), classificado como “terrorista” por Ancara e seus aliados ocidentais.

“Nós só aceitamos ordem de líderes e do nosso povo”, bradava no microfone o político conservador muçulmano às 2h, depois da eleição, a partir da varanda da central do AKP. E nos eventos de campanha, frisou: “É melhor acreditarem num homem temente a Alá do que num beberrão.”

Terremoto e crise econômica não influenciaram as urnas

Em seguida ao devastador terremoto de fevereiro último, que só na Turquia matou mais de 51 mil, muitos pensavam que a deplorável gestão de crise nos redutos eleitorais do AKP, situados no epicentro do sismo, custaria a Erdogan um cartão amarelo ou vermelho nas eleições. Mas também aqui a realidade foi outra.

Nas regiões em questão, o presidente e sua legenda não sofreram perdas significativas, apenas pouco menos de dois pontos percentuais. E esses não beneficiam o oposicionista Kilicdaroglu, mas sim Ogan, do MHP.

Tampouco a desastrosa situação econômica – com inflação extremamente elevada, alto desemprego e êxodo de cérebros em massa por parte dos universitários formados – prejudicou Erdogan. Ao que tudo indica, muitos creem que o mandatário será capaz de tomar novamente o leme nas mãos e reconduzir a Turquia a águas prósperas.

Nas próximas duas semanas, todos os olhos estarão voltados para Sinan Ogan. No tocante a sua ideologia, o ex-deputado do radical de direita MHP pertence antes à Aliança Republicana do presidente. Agora ele tem todos os trunfos na mão: com seus 5%, pode se permitir recostar-se e esperar que ofertas lhe farão as alas governista e oposicionista. Pois ambas sabem que agora todos os caminhos passam por Ogan.

O fato de, no passado, o ultranacionalista ter frequentemente esbravejado contra Erdogan tampouco significa que Kilicdaroglu possa contar com o apoio dele. Como dito: as coisas nunca acontecem como se pensa.

Erkan Arikan é editor-chefe da redação turca da DW. O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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