
Muriqui Instituto de Biodiversidade realiza ações para salvar primata ameaçado. Manejo de primatas em mata cercada em Ibitipoca (MG) marca história da espécie. Muriqui-do-norte é primata exclusivo da Mata Atlântica
Ananda Porto
Como ajudar a salvar uma espécie do risco da extinção? Essa é a pergunta que todos os apaixonados pela biodiversidade fazem para si e para a sociedade como um todo. Existem inúmeras maneiras de unir esforços para evitar o desaparecimento dos mais diferentes seres da fauna e flora do mundo. Pensando em amenizar os impactos e ajudar o maior primata das Américas a sobreviver na Mata Atlântica, um grupo de especialistas composto por biólogos e médicos veterinários se uniu e fundou o MIB – Muriqui Instituto de Biodiversidade.
Mas que macaco é esse? O muriqui é um primata exclusivo do nosso território, e é necessário lembrar que existem duas espécies diferentes no Brasil. Além de alguns detalhes morfológicos distintos, eles se distribuem em áreas geográficas diferentes, tanto que levam no nome vernacular o território ao qual pertencem.
Uma população refere-se aos muriquis-do-norte (Brachyteles hypoxanthus) presente no Sul da Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e parte norte do Rio de Janeiro, outra aos muriquis-do-sul (Brachyteles arachnoides), que ocorrem em São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. Ambas as espécies estão ameaçadas, porém a população do norte encontra-se em uma situação muito mais crítica.
MIB realizou iniciativa pioneira ao reunir muriquis em área cercada
João Marcos Rosa
“O muriqui-do-norte possui uma população de 1000 a 1200 indivíduos na natureza, é uma espécie criticamente em perigo e a gente tem 12 populações, talvez 13 remanescentes na natureza e isso implica um território muito pequeno”, explica Fabiano Melo, biólogo e um dos membros fundadores do MIB.
A equipe do projeto junto com apoiadores e parceiros se dedica a monitorar e estudar os grupos de muriquis-do-norte de perto, assim ao conhecer mais sobre o comportamento, as ameaças e o ambiente em que esses macacos estão inseridos, eles conseguirão traçar estratégias para ajudar a aumentar a população da espécie e amenizar também os impactos para a espécie.
Em maio de 2025 o Muriqui Instituto de Biodiversidade completou 10 anos de atuação nas atividades em prol da conservação desse grandalhão da floresta, e ao longo dessa década o time conseguiu aprender mais sobre a espécie e ainda realizar um feito inédito: consagrar um grupo de muriquis em uma área controlada de mata, na região de Ibitipoca, em Lima Duarte (MG), território em que não havia mais uma população consagrada da espécie.
Nascimento do primeiro filhote em recinto marca história do primata na natureza
João Marcos Rosa
“A gente consolidou pela primeira vez na história dessa espécie uma população cativa, ou seja, trouxemos bichos da natureza e colocamos em uma condição única que chamamos de manejo integrado, que é o Muriqui House – ou se traduzido a ‘casa do muriqui’, nessa área só tinham sobrado dois machos e conseguimos capturar esses muriquis e trouxemos de outras localidades, duas fêmeas. Isso foi muito importante porque a gente juntou quatro animais e eles ressocializaram”, comenta Fabiano.
Esses primatas foram manejados em uma área privada em 2017 em parceria com o Ibitiprojeto, e objetivo desde o início era formar uma população nesse recinto florestal cercado para que futuramente eles possam reintroduzidos na região.
Atualmente nessa “casa” dos muriquis existem oito indivíduos e um deles é fruto de esperança da equipe e principalmente para a espécie, o Eliot. A equipe do MIB divulgou uma história desse filhote na plataforma do YouTube em um documentário.
Eliot é o filhote de muriqui que representa a esperança para o futuro da espécie
João Marcos Rosa
“No Muriqui House aconteceu um grande feito na história da conservação dessa espécie, foi ali que nasceu o primeiro filhote de muriqui-do-norte nessas condições de cativeiro, e isso nos orgulha muita porque a gente aprendeu. Então é possível hoje com esse tipo de manejo integrado, proteger a espécie em longo prazo porque de fato só dependendo da Mata Atlântica e em particularmente envolvendo as mudanças climáticas que mostram que o cenário futuro será muito desafiador, não vai ser possível proteger os bichos apenas nessa condição de floresta. O Eliot, fruto dessa reprodução em cativeiro nos trouxe vários ensinamentos e lições importantes que serão decisivas para a proteção da espécie no futuro”, explica o primatólogo.
Abraço de muriqui
Outro fato marcante nessa trajetória da organização foi o abraço duradouro dos irmãos Luna e Bertolino, os dois machos de muriquis-do-norte que estavam vivendo isoladamente na região Ibitipoca.
Para introduzi-los na área de mata cercada e monitorada, foi necessário realizar a captura de cada um deles individualmente, e nesse processo durante uma captura e outra eles ficaram separados. Ao se reencontrarem no recinto, os irmãos permaneceram entrelaçados por duas horas, algo nunca observado e registrado na natureza.
Muriquis-do-norte ficam duas horas abraçados, após reencontro
Semeadores de floresta
Proteger o muriqui é também uma forma de proteger a floresta e toda a vida que depende dela. Por isso, ao trabalhar com a espécie outros organismos são beneficiados e protegidos também. Sem floresta preservada não há muriqui e sem muriqui também não haverá floresta, afinal, esse primata é considerado um dos principais semeadores da Mata Atlântica.
“A gente tem estudos de longo prazo, que mostram que o muriqui é um excelente dispersor de sementes, ele se alimenta de folhas principalmente, mas ele também se alimenta de frutos maduros que a floresta oferece, e esses frutos quando ele come, ingere sementes que passam pelo trato digestivo dele, posteriormente elas caem na floresta, e como eles vão se deslocando pela floresta, procurando por comida e eles acabam dispersando essas sementes em longas distâncias e isso ajuda a floresta a regenerar”, explica Fabiano.
Muriqui é considerado ‘jardineiro’ da floresta por dispersar sementes
Ananda Porto
Equipe e parceiros
A equipe do Muriqui Instituto de Biodiversidade é composta por um corpo técnico e para desenvolver os projetos de conservação o time conta com apoio de diversas instituições como o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros do ICMBio, Projeto Muriqui de Caratinga, Ibitiprojeto, Universidade Federal de Viçosa, Re:wild e The Rufford Foundation.
Equipe de pesquisadores utiliza tecnologia para monitorar muriqui-do-norte
Divulgação/MIB
Desafios de conservar
São inúmeros os desafios enfrentados pelos pesquisadores para salvar o muriqui da extinção, mas nesses dez anos de caminhada e dedicação bons frutos já estão surgindo, hoje o conhecimento sobre a espécie é superior, e a busca atual é principalmente por conseguir mais apoiadores para que seja possível continuar pesquisando, investindo e aprimorando os estudos sobre esse primata. “Os desafios nos próximos 10 anos é consolidar o MIB com uma estrutura financeira, administrativa, muito sólida e muito coerente”, pontua Fabiano.
No site do MIB é possível contribuir com doações para apoiar o trabalho da equipe e da vida desse importante semeador de floresta.
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