Quem manda no Golfo do México — e como Trump pode mudar o nome?


O presidente eleito dos Estados Unidos sugeriu mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América. Donald Trump sugeriu mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América.
Getty Images via BBC
Mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América: foi isso que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, sugeriu na terça-feira (7/1).
“Muito em breve anunciaremos a mudança… porque fazemos a maior parte do trabalho lá, e ele é nosso… vamos mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América”, declarou durante entrevista coletiva em sua residência em Mar-a-Lago, na Flórida.
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“Golfo da América, que nome bonito. E é apropriado…”, acrescentou, sem fornecer mais detalhes sobre sua proposta.
Na sequência, Trump afirmou que o México “deve parar de permitir que milhões de pessoas entrem em nosso país” — e posteriormente reiterou sua ameaça de impor “tarifas muito sérias” ao México e ao Canadá.
Trump não disse como nem quando planeja realizar a mudança de nome do Golfo do México, mas logo após suas declarações, a deputada republicana Marjorie Taylor Greene afirmou que apresentaria rapidamente um projeto de lei para mudar o nome do Golfo do México.
“O segundo mandato do presidente Trump teve um GRAN começo”, escreveu Taylor Greene no X (antigo Twitter). “Vou apresentar uma [proposta de] legislação o mais rápido possível para mudar oficialmente o nome do Golfo do México para seu nome legítimo, Golfo da América!”
Mas será que é possível mudar o nome de um corpo d’água internacional?
A quem pertence o Golfo do México?
O Golfo do México, que abrange uma área de mais de 1,6 milhão de km², é uma bacia oceânica contida entre o Oceano Atlântico e o Mar do Caribe, entre os litorais do leste do México, do sudeste dos Estados Unidos e do oeste de Cuba.
Cinco Estados mexicanos possuem costa no golfo: Tamaulipas, Veracruz, Tabasco, Campeche e Yucatán. Assim como os Estados americanos da Flórida, Alabama, Mississippi, Louisiana e Texas, e as províncias cubanas de Pinar del Río e Artemisa.
O golfo é uma das regiões produtoras de petróleo offshore mais importantes do mundo, sendo responsável por 14% da produção total de petróleo bruto e 5% da produção de gás natural seco dos Estados Unidos.
Para o México, o golfo também é fundamental, pois é de lá que é extraída a maior parte do petróleo do país, um dos principais motores de sua economia.
Há acordos internacionais de delimitação de fronteiras marítimas estabelecidos por organizações como a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar entre os Estados Unidos e o México, os Estados Unidos e Cuba, e o México e Cuba.
A delimitação da fronteira do Golfo do México entre os Estados Unidos, México e Cuba também foi definida pela mais alta autoridade internacional em delimitação de mares, a Organização Hidrográfica Internacional (IHO, na sigla em inglês).
Por que se chama Golfo de México
O corpo d’água foi chamado pela primeira vez de Golfo do México nos mapas europeus do século 16.
Como escreveu Susan Parker no St. Augustine Record, um jornal local da Flórida, “Baptiste Boazio, o ilustrador e cartógrafo das expedições caribenhas do (explorador inglês) Francis Drake na década de 1580, usou o ‘Golfo do México’ em seu mapa chamado ‘Vista de toda a rota da viagem de Sir Francis Drake às Índias Ocidentais'”.
“O mapa de De Bry de 1591 também usa o nome Golfo do México”, ela acrescenta.
Já um mapa de 1630 chamou o corpo d’água de “Golfo da Nova Espanha”, nome que, sob o Vice-Reino da Nova Espanha, incluía o que hoje é a Flórida, parte do sudeste dos Estados Unidos, México e grande parte da América Central.
Mas Golfo do México é o nome que continuou a ser usado com mais frequência por mais de 400 anos.
É possível mudar o nome?
Para começar, Trump precisaria da aprovação do México e de Cuba para mudar o nome do Golfo do México.
Mas a presidente do México, Claudia Sheinbaum, já rebateu a proposta de Trump.
Com um sorriso no rosto e mostrando um mapa-múndi de 1607, no qual parte do território mexicano e parte do território dos Estados Unidos aparecem como uma única unidade — sem a separação de fronteiras que existe hoje —, ela sugeriu na quarta-feira (8/1) mudar nome dos EUA para “América Mexicana”.
“Por que não os chamamos (os Estados Unidos) de América Mexicana? Soa bem, não é verdade?”.
“Desde 1607, a Constituição de Apatzingán era da América Mexicana. Portanto, vamos chamar de América Mexicana”, acrescentou.
Sheinbaum enfatizou que o nome Golfo do México é reconhecido internacionalmente.
“Acredito que ontem, com todo o respeito, o presidente Trump estava mal informado, achando que Felipe Calderón e García Luna ainda governavam o México, mas não. No México, o povo governa”, concluiu a presidente.
Em paralelo, o secretário de Economia do país, Marcelo Ebrard, reiterou que o corpo d’água “vai continuar a ser chamado de Golfo do México”.
“Não podemos responder a todas as declarações todos os dias”, declarou Ebrard.
“Se nos encontrarmos daqui a 30 anos, o Golfo do México ainda vai se chamar Golfo do México. Mas não vamos nos envolver nesse debate. O que vamos fazer é proteger o relacionamento que nossos dois países têm”.
Trump também precisaria da avaliação e aprovação de vários organismos internacionais, incluindo a Organização Hidrográfica Internacional, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e o Grupo de Especialistas das Nações Unidas em Nomes Geográficos (UNGEGN, na sigla em inglês).
Além disso, como o Golfo do México abriga uma grande variedade de habitats e ecossistemas marinhos e costeiros, um novo nome implicaria em mudanças legais nas cartas náuticas, nos mapas oficiais e na legislação nacional, que cada país envolvido teria que contemplar.
Trump pode mudar o nome unilateralmente?
Mesmo que o México e Cuba se oponham à mudança do nome do golfo, é provável que Donald Trump consiga realizar seu desejo, embora outros países possam não reconhecer o nome Golfo da América.
Nos Estados Unidos, há mecanismos para renomear locais reconhecidos pelo governo federal.
Um deles é o Conselho para Nomes Geográficos (BGN, na sigla em inglês), órgão cujo objetivo é estabelecer e manter o uso uniforme de nomes geográficos no governo federal.
O conselho não cria nomes para lugares geográficos, mas aprova ou rejeita novos nomes propostos por agências federais, governos estaduais ou municipais e pela população.
Se levar adiante sua proposta, Trump não seria o primeiro presidente americano a pedir uma mudança de nome geográfico.
Em 2015, o BGN aprovou a solicitação do então presidente Barack Obama para mudar o nome do Monte McKinley, o pico mais alto da América do Norte, para Monte Denali, nome usado por gerações de povos nativos do Alasca, que significa “pico mais alto do mundo”.
A montanha havia sido batizada em homenagem a William McKinley, um político de Ohio que foi eleito presidente dos EUA em 1896, e assassinado apenas seis meses após o início de seu segundo mandato.
McKinley nunca pôs os pés no Alasca, e Obama declarou que seu objetivo ao mudar o nome da montanha era melhorar as relações com os povos nativos americanos.
Aliás, Trump indicou no passado que deseja reverter a mudança do nome, para que o Monte Denali volte a se chamar Monte McKinley.
E, se o BGN aprovar um eventual pedido de Trump para mudar o nome do Golfo do México, não seria a primeira vez que mexicanos e americanos divergem sobre como chamar um corpo d’água contido em suas fronteiras.
O rio que atravessa a fronteira entre o Estado americano do Texas e os Estados mexicanos de Chihuahua, Coahuila, Nuevo León e Tamaulipas é conhecido como Rio Grande entre os americanos, enquanto os mexicanos o chamam de Rio Bravo.
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