Acidentes com alunos em escolas: entenda quais são os deveres das instituições e os direitos dos pais


Incidentes com mortes de estudantes na região de Ribeirão Preto (SP) levantam dúvidas sobre como profissionais devem agir para prevenir ocorrências. g1 ouviu advogado especialista em direito educacional. Fachada da escola onde estudante que morreu no domingo (15) bateu a cabeça em Miguelópolis (SP)
Murilo Badessa/EPTV
Um menino de 5 anos atingido por uma casa de brinquedo em Barretos (SP). Um adolescente de 16 anos que caiu e bateu a cabeça no chão durante uma brincadeira com colegas de sala em Miguelópolis (SP). Em comum, os dois incidentes ocorridos em agosto e em setembro na região de Ribeirão Preto (SP) resultaram na morte de alunos dentro do ambiente escolar.
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Episódios que, além da dor causada a famílias e pessoas ligadas à comunidade escolar, levantam a discussão sobre os deveres das instituições de ensino e os direitos dos pais diante de acidentes.
Como é possível avaliar se houve negligência? Em que casos a escola deve ou não ser responsabilizada na Justiça? O que as unidades devem oferecer aos estudantes para garantir a integridade dos alunos?
Em entrevista ao g1, o advogado especialista em direito educacional Fabiano de Jesus Ferreira, autor do livro “Manual Jurídico do Professor”, fala sobre essas e outras dúvidas.
“A escola, seja ela pública ou privada, tem que propiciar um ambiente seguro, seja um ambiente no sentido da sua estrutura para que ali não apresente risco de provocar um acidente para os alunos e também para todas as pessoas que transitam dentro daquele ambiente”, afirma.
Confira, nos tópicos, a seguir, algumas questões sobre o tema:
Quais deveres da escola para evitar acidentes?
O que a legislação diz sobre funcionários monitorando alunos?
Como a escola deve agir em caso de acidente?
Quais os direitos dos pais?
Quando a escola é responsabilizada por acidentes com alunos?
O aluno pode ser responsabilizado?
1-Quais deveres da escola para evitar acidentes?
De acordo com o advogado, qualquer escola, pública ou provada, deve proporcionar um ambiente seguro para os alunos e funcionários, tanto do ponto de vista físico quanto psicológico.
Isso significa, por exemplo, antever situações de risco, como os relacionados à manutenção da estrutura escolar, tanto os que dizem respeito à acessibilidade, como danos no piso, como para o funcionamento das atividades, como fiação elétrica.
“Um exemplo: uma escola que tem uma escada e o corrimão apresenta algum defeito. Então, o gestor daquela escola, seja pública ou privada, tem que dar os encaminhamentos o mais rápido possível para que aquele problema seja solucionado. Para que depois, amanhã, alguém não vá segurar no corrimão e venha a cair e sofrer um acidente”, diz.
O Código Civil, a Constituição Federal e mesmo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) são algumas das legislações que tratam desse assunto.
Segundo o especialista, essas prerrogativas são válidas em qualquer instituição e não podem ter menor peso do que as regras estabelecidas por um contrato de um colégio particular, por exemplo.
“”Uma escola particular não pode colocar uma cláusula ali que se acontecer um acidente dentro da escola ela não tem qualquer responsabilidade. Porque essa cláusula está ferindo um direito constitucional daquele aluno ali de ter um ambiente seguro. Então, seria uma cláusula nula. Nenhuma cláusula de contrato pode ferir direitos e garantias fundamentais do aluno ou até mesmo de um profissional que esteja atuando naquele ambiente.”
Criança de 5 anos morreu após brinquedo de madeira cair em cima dela durante atividade na escola, em Barretos, SP
Reprodução/EPTV
2- O que a legislação diz sobre funcionários monitorando alunos?
Via de regra, segundo Ferreira, a escola deve manter sempre algum funcionário monitorando as atividades dos alunos, seja no intervalo, seja em sala de aula.
“Se o monitor observa que um aluno está pendurando lá em um galho de uma árvore ou em algum objeto e aquilo pode ocasionar um risco, ou estar começando um empurra-empurra e aquilo pode evoluir para algo mais grave, então o trabalho do monitor é garantir o máximo de proteção e estar monitorando essas situações. Isso vale para escola pública ou privada.”
Se o monitor é geralmente quem faz esse trabalho nos intervalos, em sala de aula esse papel cabe ao próprio professor.
“Durante a aula cabe ao professor e, se tiver um auxiliar, o professor e o auxiliar têm o dever de monitorar as ações que ocorrem dentro de sua sala de aula, durante a aula.”
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3- Como a escola deve agir em caso de acidente?
De acordo com o advogado, isso depende da gravidade da situação. Em casos de menor gravidade, como quando um aluno sofre um ferimento leve e não demanda maiores cuidados médicos, a escola deve documentar o fato, inclusive com fotos, e informar a família.
“Eu aconselharia que chamasse a família para ir até a escola e explicasse aquela situação, como ocorreu, todo o fato.”
Em uma ocorrência mais grave, a prioridade da escola é chamar o socorro pelos meios disponíveis para garantir o atendimento médico o mais rápido possível. Toda a documentação dos fatos é importante, mas pode ocorrer posteriormente.
“Sempre primeiro chamar o socorro médico, o Samu ou o Corpo de Bombeiros onde eventualmente não seja atendido pelo Samu, ara que esses profissionais venham prestar o atendimento adequado. Na sequência, devem informar a pessoa responsável por aquele aluno e em ato continuo deve proceder todo o registro minucioso de todos os fatos.”
4- Quais os direitos dos pais?
Os pais e responsáveis têm direito a um ambiente seguro para os filhos, assim como de procurar a unidade educacional em situações que o preocupem.
“Ele tem o direito de ir à escola conversar com a coordenação pedagógica com a direção para pedir esclarecimentos sobre determinado fato.”
Nesses casos, o funcionário deve fornecer todas as informações referentes ao que for questionado.
“Os direitos são gerais, de todo cidadão, e nesses casos também se aplica a questão do ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] ou alguma questão contratual.”
5- Quando a escola é responsabilizada por acidentes com alunos?
A escola pública ou privada responde no âmbito cível tanto quando há intenção – modo doloso – quanto quando não há intenção – o culposo.
“Tem ali um buraco no pátio da escola, o gestor não age com rapidez para solucionar e uma criança vai e quebra uma perna ali, um pé. Neste caso, a escola vai ser obrigada a indenizar essa família por aquela situação”, diz.
Eventualmente, de acordo com o especialista, funcionários podem responder criminalmente, caso o fato seja assim enquadrado. É o que ocorre, por exemplo, em um caso de omissão de um professor quando um aluno é vítima de bullying.
A sanção da lei federal 14.811, no início de 2024, criminalizou essa prática, inclusive em ambiente virtual, além de ampliar a proteção das vítimas.
“Se o professor na sala de aula percebe que está acontecendo um ato de bullying ali, uma, duas, três, quatro vezes, e aquele professor se omite diante daquela situação, ele pode eventualmente vir a responder criminalmente também junto com aquele aluno ou grupo de alunos que estava praticando o crime de bullying. Ele pode responder por omissão porque ele tem o dever legal de garantir a segurança daquele aluno que está sob a sua tutela naquele momento.”
6- O aluno pode ser responsabilizado?
No âmbito cível, um aluno menor de 18 anos não responde diretamente por problemas causados a outros colegas. Neste caso, quem responde é o pai ou o responsável por ele.
“Por exemplo: ele vai lá e quebra o celular de um colega. A mãe do outro aluno, que teve o objeto danificado, pode processar tanto a instituição de ensino quanto o pai do aluno ou a mãe daquele aluno que causou o dano, porque, em regra, o menor de 18 anos, nem vai ter renda, não vai ter patrimônio pra poder ser acionado em uma ação judicial”, explica Ferreira.
Do ponto de vista criminal, por outro lado, toda pessoa maior de 12 anos e menor de 18 anos que comete um ato infracional, ou seja, equivalente a um crime, vai responder na vara especializada, seja por uma agressão física, seja por algo correlato ao que está previsto no Código Penal.
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