Cenas de nudez e humilhações frequentes: novos vídeos e relatos expõem abusos contra calouros de medicina

Nos relatos feitos ao Fantástico, os episódios de coação e humilhação dos calouros são recorrentes. São feitas ameaças até ao futuro no mercado de trabalho. Estudantes de Medicina relatam ao Fantástico como funciona cultura de abusos entre veteranos e calouros
Nesta semana, viralizaram nas redes sociais cenas de nudez durante uma competição esportiva que aconteceu no interior de São Paulo em abril. De acordo com estudantes que estavam no ginásio na hora do jogo, as cenas são comuns e as humilhações a calouros são frequentes.
Em um dos vídeos, no fundo da quadra, durante um jogo de vôlei feminino, um grupo de homens exibe e toca as partes íntimas. Em outro vídeo, mais de vinte estudantes da Universidade Santo Amaro aparecem correndo com os shorts abaixados. Veja no vídeo acima.
A repercussão provocou uma onda de cobranças. E quinze alunos do curso de medicina da UNISA foram expulsos.
A Polícia Civil de São Carlos, onde aconteceram os jogos universitário, diz que vai ouvir alunos envolvidos nos próximos dias. E que apura o cometimento dos crimes de:
ato obsceno, quando a ação não visa uma pessoa específica,
e de importunação sexual, que ocorre quando há impulso sexual direcionado.
Já a resposta da UNISA foi expulsar alunos que identificou nas imagens e por meio de denúncias
“Esses eventos não têm nenhuma relação com a universidade, inclusive o próprio estatuto da atlética reconhece essa independência e essa autonomia. Não é exatamente uma surpresa para nenhum aluno esse tipo de punição”, diz Marcos Aurélio Carvalho, advogado da UNISA.
Especialistas defendem uma discussão para além das punições individuais.
“É muito difícil a gente imaginar que a melhor coisa que uma universidade tem a fazer com tem a fazer com ingressantes que tem 17, 18, 19 anos, é expulsar. Imaginar que esse problema acabou”, diz Miqueli Michetti, socióloga, professora da Universidade Federal da Paraíba.
“É importante você ter medidas socioeducativas, por exemplo. Eles vão frequentar o hospital da mulher durante um mês, acompanhando o atendimento de estupro, de violência contra a mulher e contra as pessoas. Isso sim vai poder ensinar. Que muitas vezes eles não entendem aquilo como um ato violento”, diz Sérgio Baldassin, professor no Departamento de Neurociências da Faculdade de Medicina do ABC.
Humilhações
Novos vídeos e relatos de alunos expõem outras situações de constrangimento e humilhação em trotes.
Um vídeo de rede social mostra quando estudantes são obrigados a se juntar em uma roda com fogos de artifício soltando faíscas. Outro vídeo mostra veteranos incentivando uma corrida de calouros nus.
São feitas ameaças até ao futuro no mercado de trabalho.
“Aqui as coisas funcionam na base do respeito e da hierarquia. Se quiser ser ‘o’ estudante de medicina, aquele que recebe indicações para plantões, vocês têm que aprender e se submeter às regras”, disse uma estudante que não quis ser identificada.
Os ataques nos trotes também podem ser escatológicos. “Cospem, xingam, tacam ‘mijosta’ e é normal isso assim, pra eles. Essa mistura de urina com fezes”, relata a estudante.
O que dizem os envolvidos
Nenhum dos alunos expulsos aceitou dar entrevista ao Fantástico. Mas cinco deles se manifestaram por meio de seus advogados.
A defesa de dois estudantes afirma que seus desligamentos foram sumários, sem direito ao devido processo legal e à ampla defesa.
Os advogados de outros três alunos dizem que “atos infelizes” foram “impostos aos calouros pelos veteranos da universidade”. Que essa conduta inclui “agressões, ofensas e humilhações”. E que “não se trataram de atos isolados, mas de algo que vem acontecendo já há muitos anos nessas universidades”.
A Atlética José Douglas Dallora, de alunos da UNISA, disse por meio de advogados que “eventuais episódios de trote, violência e atos obscenos são individualmente praticados por agentes autônomos, os quais não representam a instituição”.
Veja íntegra da reportagem no vídeo que abre este texto.
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