Hip hop 50 anos: movimento que estabeleceu raízes em Campinas ainda luta por reconhecimento

Manifestação urbana que se expressa pela música, dança e artes plásticas, comemora conquistas e enfrenta preconceitos. Hip-hop 50 anos movimento estabeleceu raízes em Campinas
Augusto de Souza/Karina Caumo/Francine Bueno
O hip hop completa 50 anos nesta sexta-feira (11) e tem Campinas (SP) como um dos polos do movimento cultural urbano no Brasil com manifestações desde a década de 1980. Mas apesar de enraizada na cena da metrópole, ele ainda enfrenta, segundo seus protagonistas, o preconceito de parte da sociedade e luta por reconhecimento.
Para celebrar a data, o g1 conversou com representantes dos diferentes pilares que formam o hip hop e que desenvolvem atividades de música, dança e artes gráficas em Campinas.
Conquistas e desafios
Manifestação cultural urbana de reivindicação e luta, o hip hop tem como marco inicial uma festa que ocorreu no Bronx, em Nova Iorque, em 11 de agosto de 1973. E o movimento não demorou muito para chegar a outras partes do mundo a partir de quatro pilares: o rap, o DJing, o breaking e o graffiti.
Em Campinas o movimento apareceu na década de 1970 como uma forma de apropriação de espaço e produção cultural que cresceu de diferentes formas em relação as variadas modalidades de manifestação. Sendo considerada um polo do hip hop desde a década de 1980.
“O hip hop busca esses lugares como a cidade de Campinas, ele busca aquele centro todo movimentado que não para, com tantas pessoas em situação de rua, é aí que o hip hop está trazendo cores nas paredes pra vida daquelas pessoas que passam, ou que estão por ali todos os dias, pros jovens traz a poder da consciência, da voz, da expressão, ao invés da violência que somos expostos diariamente!”, diz Francine Bueno, conhecida por Fran Killa, Arte Educadora e Bgirl.
Batalha do Cálice, em Campinas
Augusto de Souza / @ gasalucinacao
As batalhas do rap
Uma das grandes expressões do movimento é a batalha que coloca MCs em confronto, onde esses disputam a aclamação do público fazendo rimas nos mais diferentes assuntos.
Elas ocorrem por toda a metrópole quase todos os dias da semana, em eventos que são semanais, quinzenais, mensais ou sazonais.
Mas apesar de ter bastante presença, seus protagonistas garantem que ainda sofrem com preconceito e muitas vezes enfrenta o poder público.
“Sempre vai ter um preconceito de alguém achar que a batalha é um movimento marginalizado. Um exemplo é a aldeia. Quando no começo todo mundo achava que era um evento marginalizado, policial parando evento várias vezes e tal”, pontua MC Azec.
Atualmente, é possível encontrar as batalhas acontecendo em diversas partes da metrópole, as de maior destaque são a “Estação das Rimas”, a primeira batalha organizada apenas por mulheres que acontece quinzenalmente às segundas, na Estação Cultural; e a “Batalha do Cálice”, que acontece no Largo do Pará toda sexta-feira.
Segundo Azec, que organiza a “Batalha do Cálice”, ela é o pilar das batalhas na região e reúne cerca de 100 pessoas semanalmente com MCs de cinco municípios diferentes. E desde sua criação em 2017, já passou a fazer parte das seletivas do Circuito Paulista de Batalha de MCs.
Para Azec, o movimento vem ganhando força a partir de um público fiel que transita em menor escala nas outras batalhas da região. O MC ressalta que no evento já circularam famosos no meio, como o Jovem MK e Bruno Lima.
A dança que se transforma em esporte
O breaking teve suas primeiras manifestações em Campinas, segundo Ciro do Hip-hop, ainda na década de 1970, com grupos que dançavam no Largo do Rosário. A cena foi evoluindo e conquistando espaços na cidade que ajudaram na formação dos grupos atuais.
Marina Vieira Farias na Sala dos Toninhos, Estação Cultura, em Campinas
Karina Caumo
Francine Bueno, Arte Educadora e Bgirl, termo utilizado para identificar o dançarino de breaking, comenta que é muito mais comum ver o breaking nas capitais. Mas Campinas se destaca do resto do interior, pois, assim como o graffiti, a dança é uma linguagem muito utilizada nas OSCs da metrópole.
“Vou ser jurada de uma batalha de breaking kidz, com as crianças do projeto Instituto Bem Querer (IBQ), que vai acontecer no Anfiteatro da cidade de Sumaré-SP”, comemora Fran Killa.
A atual campeã da seletiva estadual de breaking, Marina Vieira Farias, comenta que seu primeiro contato com a dança foi na infância e que era difícil encontrar lugar para treinar, o que a afastou por um tempo.
“Em 2008 eu tive meu primeiro contato com o hip hop através de uma academia de dança do meu bairro, e lá comecei a fazer aulas. Meu professor, com o tempo, se desvinculou da academia e montou um grupo independente, e então eu o acompanhei. Por um tempo não tínhamos onde treinar, ensaiávamos na quadra de uma escola pública aos finais de semana e às vezes ensaiávamos na rua”, lembra Marina.
Diferente das Batalhas de Rimas, as dançarinas consideram que breaking não conquistou ainda uma presença tão forte na metrópole. Mas ele é crescente e já serviu de palco para eventos qualificatórios em campeonatos como o “Battle of the Year”.
Francine Bueno, sou Arte Educadora e Bgirl no Memorial da América Latina, São Paulo
Francine Bueno / Arquivo pessoal
Marina destaca a importância da Estação Cultura como um espaço de eventos recorrentes de hip hop onde é possível ver batalhas de All Style acontecendo.
Ao comentar sobre a entrada do breaking nas Olimpíadas – haverá disputa de medalhas pela primeira vez a partit dos Jogos de Paris, em 2024 -, Marina e Francine ponderam sobre as divergências que surgiram na comunidade em relação ao impacto que teria um movimento cultural de contestação se tornar um esporte. Mas apontam oportunidades.
“A possibilidade de ter apoio financeiro, patrocínios, treinar em um espaço adequado e ter profissionais da saúde te acompanhando, está mais atingível agora que o breaking não é apenas uma “‘dança de rua’’, uma ‘dança marginalizada’”, finaliza Marina.
Arte gráfica das ruas
Embora o rap e o breaking possam ser vistos em momentos específicos nas batalhas ou eventos, talvez a manifestação cultural do hip hop mais constante pela sua perenidade é o graffiti.
Ação da Arte Educadora Francine Bueno na OSC Ana Brasil-Jd Nilópolis, Campinas
Francine Bueno / Arquivo pessoal
Feito em mutirões voluntários ou de forma solitária, em enormes muros de escolas, fábricas e até empenas de edifícios. É possível encontrar diferentes artes por Campinas, como os projetos como os murais do Viaduto da Av.Aquidabã ou como a Pista de Skate da Praça das Águas.
Francine comenta que já aconteceram eventos na cidade, mas atualmente eles deixaram de ser realizados. Ainda assim, a arte continua viva e presente como uma potência na educação e muito presente na metrópole.
“Hip hop está trazendo cores nas paredes pra vida daquelas pessoas que passam, ou que estão por ali todos os dias, pros jovens traz a poder da consciência, da voz, da expressão, ao invés da violência que somos expostos diariamente!”, finaliza.
*Sob supervisão de Fernando Evans
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