Novo teste do pezinho pode mudar a vida de nascidos, mas está sem previsão de oferta em SC

Em  maio de 2021 o Governo Federal sancionou a Lei 14.154, mais conhecida como Teste do Pezinho Ampliado, ampliando para 53 o rastreio de doenças através do exame. Dois anos depois, contudo, a saúde pública estadual de Santa Catarina ainda não oferece o novo exame à população, deixando famílias ‘às cegas’ sobre diagnósticos.

A realidade catarinense é comum a de outros estados brasileiros e, segundo o Governo Federal, a implementação vai ocorrer de forma gradual e em etapas.

A lei sancionada em 2021 alterou o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), visou melhorar o PNTN (Programa Nacional de Triagem Neonatal e estabelecer quais doenças podem ser rastreadas pelo exame.

Pezinho de Arthur, filho de Bárbara Nunes – Foto: BÁRBARA NUNES/DIVULGAÇÃO/ND

Carmen Zanotto,  secretária de Estado da Saúde,  comenta que ainda não há previsão para o novo exame do pezinho ser implementado em Santa Catarina.

“Os prazos para a implementação das demais patologias seguem um cronograma que ainda é muito lento, o que precisamos fazer é discutir junto ao Ministério da Saúde para reduzir esses prazos”.

Uma gota, vidas salvas

Quando Bernardo Broc, de 8 anos, nasceu, o procedimento básico do Teste do Pezinho, que retira uma gota de sangue do calcanhar para análise,  não identificou a AME (Atrofia Muscular Espinhal), uma doença rara que, de acordo com o Ministério da Saúde, afeta um a cada dez mil bebês no país. As principais consequências ao paciente são dificuldades motoras e respiratórias.

Bernardo com a família, que mora em Concórdia – Foto: LUANA BROC/ARQUIVO PESSOAL/ND

Depois de meses em busca por respostas, a família de Concórdia, recebeu o resultado de AME tipo 1, mas para isso precisou sair do Estado para saber do diagnóstico.

“Foi uma saga de levar para pediatras e  neurologistas, a gente foi para Porto Alegre (RS), consultou com outros neurologistas que indicaram o exame genético para ver se o Bernardo teria AME ou não”, lembra Luana Broc, mãe do garoto.

Hoje o pequeno conta com o apoio de uma equipe de profissionais de saúde em sua rotina de tratamento: fisioterapeutas, médicos, enfermeiros e fonoaudiólogos.

A fisioterapeuta Daiane Zanella está com o Bernardo desde o início do tratamento e diz que vê a evolução da criança.

“Eu acompanhei toda a luta dos pais. Hoje em dia é mais tranquilo, pois eu sei o que posso fazer com ele, clinicamente sei qual o melhor tratamento no momento”.

Bernardo, que tem AME, sendo medicado – Foto: LUANA BROC/ARQUIVO PESSOAL/ND

Além de todo o trabalho multidisciplinar necessário, Bernardo recebe a cada quatro meses uma dose do remédio Spinraza (Nusinersena). O procedimento é feito no Hospital São Francisco, que é o segundo espaço de saúde autorizado para aplicação do fármaco. O primeiro é o Hospital Infantil Joana de Gusmão, em Florianópolis.

Levantamento do Grupo ND mostra que em Santa Catarina, treze pacientes fazem a aplicação do Spinraza, que é capaz de reduzir a progressão da doença. Zongensma e Risdiplam são outros dois disponíveis no SUS (Sistema Único de Saúde).

A jornalista Bárbara Nunes, de Florianópolis,  também acompanhou a realização do exame básico logo após o nascimento do filho Arthur, de 3 anos e, assim como Bernardo, nenhuma doença foi diagnosticada inicialmente no teste ofertado na rede pública de saúde.

“O sangue não saiu, tiveram que refazer o procedimento, mas jamais deixaria de fazê-lo. Sempre soube da importância, que permite identificar doenças graves, antes mesmo do surgimento dos primeiros sintomas, facilitando o tratamento”.

Bárbara Nunes e o seu filho, Arthur – Foto: BÁRBARA NUNES/ARQUIVO PESSOAL/ND

Arthur não tem nenhum problema respiratório ou motor grave, mas o exame que fez poderia não identificar os riscos para um número maior de doenças, já que o diagnóstico precoce contribui para o tratamento e traz qualidade de vida ao paciente com qualquer enfermidade identificada.

As histórias logo após ao nascimento e o exame realizado por Bernardo e Arthur são iguais, mas as consequências da falta de um Teste do Pezinho Ampliado poderia evitar os caminhos diferentes. A atenção à saúde básica é a porta de entrada para a descoberta de inúmeras doenças que podem afetar as vidas de muitas famílias.

Proposta que prevê exame se arrasta na Assembleia

Na Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina, um projeto de lei sobre o tema está em discussão desde 2020. Ele prevê a realização do exame nos recém-nascidos já na sala de parto ou no berçário dos hospitais do Estado.

A proposta chegou a ser arquivada após o fim da legislatura passada, mas em março deste ano a iniciativa voltou à pauta de discussões.

Jair Miotto (União Brasil), parlamentar proponente, diz que os exames serão pagos pelo governo.

“Caso seja apontada alteração que indique a presença de AME, os pais devem ser avisados e a criança encaminhada para o devido tratamento. Os exames deverão ser custeados através do orçamento do estado”, comenta Miotto.

Como é o exame do teste do pezinho?

O PNTN (Programa Nacional de Triagem Neonatal) indica que o Teste do Pezinho deve ser feito entre o 3º e o 5º dia de vida do bebê. Disponível  no SUS,  é possível a partir do sangue coletado do calcanhar do bebê  identificar seis tipos de doenças e passar uma diagnóstico aos pais para o melhor encaminhamento.

Teste do Pezinho básico – Foto: DIVULGAÇÃO/ND

hipotireoidismo congênito
fenilcetonúria
anemia falciforme
fibrose cística
hiperplasia adrenal congênita
deficiência de biotinidase

Como é o novo exame?

Ao todo, quatorze grupos de doenças podem ser rastreadas pelo Teste do Pezinho Ampliado, o que aumenta o mapeamento de cinquenta e três doenças, incluindo as raras, como AME. O Ministério da Saúde  aponta que a disponibilização do novo exame vai ocorrer de forma escalonada e em cinco etapas.

Baseado na Lei 14.154, de 2021, a delimitação de doenças rastreadas deve ser revisada seguindo os avanços e descobertas científicas, priorizando as doenças com maior predomínio à população e que já tenham tratamentos ofertados pelo SUS.

Teste do Pezinho Ampliado – Foto: DIVULGAÇÃO/ND

Etapa 1: fenilcetonúria e outras hiperfenilalaninemias; hipotireoidismo congênito; doença falciforme e outras hemoglobinopatias; fibrose cística; hiperplasia adrenal congênita; deficiência de biotinidase e toxoplasmose congênita

Etapa 2: galactosemias; aminoacidopatias; distúrbios do ciclo da ureia; distúrbios da betaoxidação dos ácidos graxos;

Etapa 3: doenças lisossômicas;

Etapa 4: imunodeficiências primárias;

Etapa 5: atrofia muscular espinhal.

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