‘Narcogarimpo’: Secretário de Segurança do PA explica como combate ao crime na Grande Belém leva à reorganização no interior

Pará tem Altamira e Itaituba entre as 20 cidades mais violentas do Brasil. Ambas são marcadas pela ação do crime ambiental atrelado ao tráfico de drogas. Secretário Ualame Machado diz que Estado planeja nova integração com órgãos federais para investigações conjuntas. Secretário de Segurança Pública e Defesa Social do Pará, Ualame Machado.
Agência Pará
Os dois maiores municípios do Pará, Belém e Ananindeua, deixaram de figurar entre as 50 cidades mais violentas na lista do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, segundo dados divulgados na quinta-feira (20).
Em entrevista ao g1, o secretário de Segurança Pública do Pará, Ualame Machado, entende que o fortalecimento das políticas de combate ao crime na região metropolitana fez com que o crime buscasse refúgio no interior do estado e, ao chegar lá, se vê em uma nova configuração que ele chama de “narcogarimpo”.
Em resposta a isso, o secretário afirma que o Estado está buscando novas integrações. Desta vez, não apenas entre os órgãos estaduais de segurança, mas às polícias de outros estados e ainda os órgãos federais. Machado antecipa que já há conversas com a Polícia Federal, em Belém, para a criação de uma Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICO), reunindo PM, PC, SEAP com a PRF e Polícia Federal em investigações conjuntas.
As cidades do Pará, com cem mil habitantes ou mais, que ainda estão na lista das mais violentas são:
7 – Altamira (PA) – 70,5
15 – Itaituba (PA) – 61,6
26 – Marabá (PA) – 51,8
32 – Paragominas (PA) – 49,3
35 – Parauapebas (PA) – 46,9
45 – Castanhal (PA) – 44,2
50 – Marituba (PA) – 41,6
Altamira, maior município do Brasil, e Itaituba, são dois municípios bastante marcados por crimes ambientais. E é neste cenário que o tráfico de drogas busca se instalar.
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Segundo o secretário, o relatório do Fórum reúne homicídios, latrocínios, lesão corporal seguida de morte e também mortes em intervenções policiais, que apesar de serem Mortes Violentas Intencionais, não são necessariamente crimes.
“Já quando você trata de Crimes Violentos Intencionais, o Pará fechou 2022 de forma estável, sem redução ou aumento relevante”, afirma Ualame Machado.
O Pará fechou o primeiro semestre de 2023 com 23% de redução em relação a 2022, em relação a mortes violentas.
Das 50 cidades mais violentas, 7 estão localizadas no Pará. Sobre isso, o secretário diz que as cidades que aparecem nessa lista são normalmente do Norte e do Nordeste.
“Isso é um fato, por quê? A taxa de homicídio e crimes violentos de modo geral no Norte e no Nordeste é superior à média nacional e muito superior aos estados do sul e sudeste”, afirma.
Das cinco regiões do país, três tiveram alta nas mortes violentas intencionais: Sul (3,4%), Norte (2,7%) e Centro-Oeste (0,8%). As quedas ocorreram no Nordeste (-4,5%) e no Sudeste (-2%), apontam dados do Fórum.
Ualame Machado explica que o Norte só tem 27 cidades com mais de cem mil habitantes, que são analisadas, e que dessas, 15 estão no Pará.
“Não era surpresa que alguma cidade do Pará pudesse aparecer. A exemplo do Amapá, o Amapá só tem duas cidades com mais de cem mil habitantes, Macapá e Santana. E as duas estão na lista. Rondônia tem três cidades, duas estão na lista”.
O estado tem ainda a 7ª cidade mais violenta do Brasil: Altamira, com taxa de 70,5 mortes por 100 mil habitantes.
“A gente lembra que em 2005 a 2015 Altamira teve a maior taxa do Brasil com cem mortes por cem mil habitantes. Quando chegou 2017 e 2018, Altamira estava em segundo lugar, perdia para Maracanaú (Ceará) – ela tinha 133 mortes por cem mil habitantes”, compara.
De acordo com o secretário, Marituba já esteve na 8ª posição em 2017, 2018, entre as dez mais violentas do Brasil.
“Altamira não saiu e ainda está um pouco longe de sair, mas já saiu de 1ª posição para 7ª. Ananindeua, Belém e Abaetetuba, Tucuruí, são algumas cidades que nós tiramos dessa lista, além de outras cidades melhorarem a sua posição”, lembra.
Para o secretário de Segurança Pública do Pará, isso é fruto de um trabalho feito aos poucos com as ações como dos Territórios da Paz (TerPaz) e o controle penitenciário.
“Agora esse trabalho tem sido feito para o interior, que está caminhando, melhorando aos poucos, como nas regiões de Marabá, Parauapebas, que estão se afastando da lista. Mas ainda não conseguiram sair”.
Pará no caminho do tráfico
Questionado sobre um possível acirramento do combate ao crime, Machado explica que o Pará é uma rota importante para o tráfico, já que o Brasil não produz cocaína, por exemplo, mas está na rota da cocaína produzida na Colômbia, Bolívia e Peru.
A droga passaria pelo corredor do rio Amazonas ou pela rodovia Transamazônica, que começa no estado do Amazonas até chegar ao Pará.
Um dos motivos por que os traficantes usam essa rota seria: conseguir distribuir ao resto do país, o que começaria quando a droga chega ao Pará, principalmente pelas rodovias que ligam a outras regiões;
“Nós temos o porto mais próximo dos Estados Unidos e da Europa (se referindo ao porto de Barcarena). Por outro lado, tem também a questão dos crimes ambientais, do garimpo ilegal, e que está hoje em uma maior ligação ao que a gente chama de “narcogarimpo” na Amazônia, com utilização de pistas clandestinas, lavagem de dinheiro do tráfico, na mineração ilegal”, afirma.
Com relação a essa intensificação do crime no interior, o secretário entende que “com o embate fortalecido na região metropolitana de Belém, outras cidades ainda não conseguiram acompanhar a mesma tendência, porque ao mesmo tempo que você expulsa o crime, eles vão se mobilizando para outras áreas interioranas”.
Mortes de agentes públicos
Em 2021, foram 12 policiais mortos dentro e fora de serviço. No ano seguinte, foram 17, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
A taxa de mortes de agentes de segurança é a segunda mais alta do país, empatado com Tocantins: uma morte a cada 100 mil habitantes, atrás apenas de Piauí, com índice de 2,3, em 2022.
Já as mortes de civis em ações policiais saltaram de 548 em 2021 para 621 em 2022, registrando aumento de 12,7%. O índice deixa o Pará entre as cinco polícias que mais mataram no Brasil em 2022.
A taxa é de 7,7 mortes por 100 mil habitantes, atrás de Sergipe (7,9); Rio de Janeiro (8,3); Bahia (10,4); e Amapá (16,6).
Machado atribui a alta de mortes de agentes e de mortes em ações policiais a episódios ocorridos em maio de 2022.
“Nós tivemos no início de maio uma série de atentados contra policiais em decorrência de algum desagrado que o crime tinha com o que estava acontecendo nos presídios, por causa de uma série de medidas como visita íntima, essas coisas”, explica.
Segundo o secretário, o Estado teve que fazer uma operação mais ostensiva realmente em conjunto com outros estado e sobretudo no próprio estado.
“Tanto que quando você pega o 17 de policiais mortos em 2022, uma boa parte delas foi nesses poucos dias de maio. Quando você pega também as mortes nas intervenções policiais, uma boa parte delas também são desse mesmo período. Foi corrigido em 2023, no primeiro semestre, com 23% de queda em relação a 2022”, diz.
Ualame Machado afirma que Pará tem investido na integração de órgãos e corporações da segurança e que tem intensificado a integração com as polícias de outros estados no combate ao crime organizado, que atua sem fronteiras de estados.
“O governo realmente conseguiu integrar os órgãos do Estado e ainda com os órgãos federais que atuam no Pará. E a gente começou a fazer uma ponte muito boa agora a partir de dois anos pra cá, com o Rio de Janeiro, Santa Catarina, que são onde as principais lideranças criminosas estão escondidas”, alega.
O secretário também diz que a participação do governo federal está tentando mudar esse foco de poder e ser um órgão coordenador.
“A gente tem a segurança pública e tem a missão de coordenar e de poder ligar os organismos estaduais por um lado. Reunimos com o presidente da PF a fim de criarmos no Pará que é uma força integrada de combate ao crime organizado (FICO). Eu reúno PM, PC, SEAP, PRF, e Polícia Federal, para investigações conjuntas”, destaca.
Essas integrações são fundamentais para o enfrentamento do crime, afirma. “Se o crime está numa região, atuando nacional e até internacionalmente, a gente tem que também estar interligado”, defende.
Sobre as despesas com segurança
Ualame diz que a Segup tem seu próprio orçamento, que é usado para as operações integradoras, a exemplo grupamento fluvial, grupamento aéreo, porém não detalhou os valores gastos com seguranca em 2022.
“Nós tivemos essa pequena queda, porque estamos falando de investimento dentro do orçamento do Estado. Vale lembrar que em 2022 o Estado praticamente precisou apenas manter o que já tinha gastado, sem precisar aumentar, pois tivemos uma das maiores emendas de Bancada do Brasil, na Câmara Federal”, explica.
O secretário lembra que o Fundo Nacional de Segurança Pública começou a ser descentralizado nos dois últimos anos. “Com isso, a gente recebe mais de R$30 milhões por ano desse repasse federal que é obrigatório, que a gente consegue apoio”.
“A verba do estado se manteve praticamente a mesma, porque houve aporte de emenda de bancada e de fundo nacional de segurança pública, além da arrecadação do FISP, que é fundo nosso interno do estado. Então, por isso que às vezes o Estado não precisa aumentar tanto porque eu estou tendo aporte de outros meios”, afirma.

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