Alzheimer: falta de diversidade afeta pesquisa e política de cuidados, alertam especialistas

Participantes da conferência internacional sobre a doença, que se realiza em Amsterdam, apontam a desigualdade e o racismo estrutural como barreiras para estudos e tratamentos A AAIC 2023, conferência internacional anual da Associação do Alzheimer (Alzheimer´s Association), que se encerra na quinta-feira em Amsterdam, traz tantas novidades que sou obrigada a pinçar alguns dos temas que mais chamaram minha atenção. Certamente, um deles foi a mobilização dos participantes contra a falta de diversidade nas pesquisas, levando a distorções na criação de políticas públicas e no tratamento dos pacientes.
Conferência internacional anual da Associação do Alzheimer: participantes apontaram a desigualdade e o racismo estrutural como barreiras para o estudo e tratamentos da doença
Alex Park para Pixabay
No domingo, assisti on-line à palestra do geriatra Edison Iglesias de Oliveira Vidal, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (campus de Botucatu), que apresentou estudo sobre as diferenças de perspectivas sobre a doença entre pacientes brasileiros e britânicos. Entre os brasileiros, o diagnóstico havia sido feito, em média, há dois anos; entre os britânicos, o diagnóstico tinha em torno de quatro anos.
A diferença cultural era marcante entre os grupos: enquanto os britânicos privilegiavam manter o controle sobre suas decisões, como uma forma de lidar com a incerteza, os brasileiros preferiam abraçar a espiritualidade. “Tenho fé de que Deus deixa tudo preparado para nós, e de que terei uma morte tranquila”, relatava um dos participantes. Eutanásia, por exemplo, era um assunto recorrente para os britânicos, mas ausente entre os brasileiros. Para o médico, o trabalho mostra a necessidade de levar em conta as crenças dos portadores de demência, para que a abordagem seja culturalmente sensível.
A epidemiologista Megan Zuelsdorff, professora da escola de enfermagem da Wisconsin University, vem trabalhando com idosos afrodescendentes e lamentou o espectro limitado das pesquisas, que se concentram em pacientes brancos. Alicia Hong, professora de políticas públicas de saúde na George Mason University, dedicou sua palestra aos cuidadores: nos EUA, cerca de 16 milhões de pessoas zelam por familiares. São conhecidos como “hidden patients”, isto é, pacientes ocultos, porque o peso da função com frequência compromete sua saúde. Alicia detalhou levantamento com cuidadores da comunidade chinesa, que enfrentam dificuldades com a língua inglesa, o que interfere na comunicação com os médicos e administração dos medicamentos.
Na área científica, cientistas apresentaram duas novas estratégias de edição genômica através do CRISPR, uma das técnicas mais modernas de engenharia genética, que é capaz de alterar o código genético de uma célula. Uma delas reduz a produção da proteína beta amiloide no cérebro. Utilizando cobaias, Brian Aulston e seus colegas da California University San Diego desenvolveram uma técnica que tem como alvo a PPA, uma proteína chamada precursora, que tanto pode dar origem a uma outra proteína neuroprotetora quanto à beta amiloide, associada à enfermidade.
A outra tem como objetivo diminuir o impacto do gene mais comumente associado ao surgimento do Alzheimer: o APOE-e4. Herdar esse gene não garante que a pessoa vá ter Alzheimer, mas aumenta o risco: tendo uma cópia do gene as chances crescem de duas a três vezes; tendo duas cópias de APOE-e4, o risco se multiplica de oito a 12 vezes. Boris Kantor e Ornit Chiba-Falek, professores da Duke University, criaram uma terapia baseado no CRIPR com potencial para “neutralizar” o APOE-e4.
Aproveito para incluir um estudo de pesquisadores da Monash University, em Melbourne (Austrália), divulgado no dia 14, sobre a importância de mantermos o cérebro “afiado”. O monitoramento de cerca de dez mil idosos, com 70 anos ou mais, revelou que aqueles que se engajavam em atividades como frequentar aulas, usar o computador, ou escrever um diário, retardavam o surgimento de sinais de declínio cognitivo em até dez anos.

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