‘É sobre estar, sobre ocupar’, diz MC Devilzinha, rapper não-binária que está na semi-final da 1ª batalha de rimas do Festival João Rock

Artista é apontada na cena do rap como “uma das melhores da sua geração”. Ao lado de Brennuz, Maria e Neo, carioca estará na disputa de improviso que abre o line-up do festival neste sábado (3). MC Devilzinha, rapper não-binária durante batalha de rimas
Acervo / Batalha da Aldeia
Com suas raízes refletidas no próprio nome, o João Rock passou por várias mudanças ao longo dos anos, ficando mais diverso a cada edição em relação aos estilos musicais. No momento em que o palco principal abre espaço pela primeira vez na história para uma batalha de rima, o conceito de diversidade ganha contornos ainda mais importantes com a presença de MC Devilzinha na semi-final da disputa de improviso que abre o line-up do festival neste sábado (3), em Ribeirão Preto (SP).
A rapper não-binária apontada na cena hip hop como “uma das melhores da sua geração” falou com o g1 sobre arte, representatividade e a estreia no evento. Ao lado dela, batalhando nas rimas, estarão os MCs Brennuz, Maria e Neo.
Aos 21 anos, Devilzinha, que se identifica como uma trans não-binária e prefere o uso de pronomes femininos, se posiciona como representante da comunidade LGBTQIAPN+ e faz desta uma das principais pautas em suas letras.
“Eu sempre levanto a bandeira, independentemente da situação. Gente como a gente tem que estar em todos os lugares. Quando eu digo isso, me refiro a gente que se vê como libertação, que se livrou das algemas que por muito tempo nos aprisionaram. Então, pretendo sim trazer a diversidade para o palco do João Rock. Temos que estar nesses espaços também, ocupando. É sobre estar, é sobre ocupar”, define a rapper.
MC Devilzinha, rapper não-binária que estará na semi-final da batalha de rimas do João Rock 2023
Acervo / Batalha da Aldeia
Sem rótulos
Do bairro Engenho de Dentro, na Zona Norte do Rio de Janeiro, Devilzinha ganhou pela votação popular as primeiras etapas da batalha de rimas. No início, eram 16 competidores, dos quais oito foram escolhidos pela organização do João Rock e oito, pela Batalha da Aldeia (BDA), maior coletivo cultural de batalhas de rimas do Brasil.
Para conquistar esse resultado, bem como outra recente vitória em disputadas da BDA, a rapper aposta na versatilidade para expressar suas ideias, que não ficam restritas às pautas LGBTQIAPN+, ainda que estas permeiem a maioria de suas letras.
Rapper MC Devilzinha durante votação em batalha de rima
Acervo / Batalha da Aldeia
“Eu gosto de trazer de tudo quando rimo. Trago os papos retos da minha vivência, como uma pessoa preta na sociedade, uma pessoa trans, mas também trago a brincadeira. Até porque eu não me limito às coisas superficiais, não me limito a rótulos. Apenas sou eu e acredito que isso encanta as pessoas de alguma forma”, avalia.
Esse posicionamento autêntico também transparece em seu “vulgo” (nome artístico dos MCs), que recentemente mudou de “Devil” para “Devilzinha”, como resultado de um processo de autoidentificação e libertação, que ainda não terminou.
“A minha identidade, pra mim, ainda é uma dúvida, mas, hoje, estou me encontrando bem mais que no passado. Eu comecei como um cara gay na cena, depois fui me identificando de outras formas. É um processo até eu falar ‘Pronto. É isso!’. Não é sobre gerar dúvidas, é sobre buscar verdades”, explica. Segundo a MC, o novo vulgo é sinônimo de força e de resiliência, que a faz se sentir mais à vontade.
Diversidade no palco
De acordo com Bob 13, sócio-fundador e apresentador da Batalha da Aldeia, a autenticidade de MC Devilzinha faz dela uma potência entre os talentos que estão surgindo na cena musical. “Ela é uma MC libertária. O estilo dela é falar sobre tudo, sobre corpo, gênero, ideologia, sem papas na língua. É uma das melhores da geração e está pronta para voar”, elogia.
Não por acaso, ela se destacou nesse projeto em parceria com o João Rock, cuja ênfase foi justamente na diversidade, como lembra o apresentador. No contexto de um festival tão grande e variado, ele avalia a Batalha de Rimas como uma “oportunidade gigantesca de abranger a questão da liberdade de escolha e da multiplicidade de pessoas que estão representando o nosso movimento”, afirma.
E para quem questiona a presença das rimas no palco principal, Bob 13 avisa: “Elas têm tudo a ver, porque são universais. Se colocarmos uma batida de rap, vamos rimar em cima, se colocarmos o rock, também. É uma parada que envolve todos os estilos musicais. Fora que a Batalha é democrática, as pessoas têm o direito de votar, é uma conexão perfeita que criamos. Vai ser fantástico”.
Provocar a revolução
Feliz e agradecida com a resposta ao seu trabalho, MC Devilzinha lembra que tudo é resultado de esforço e muita persistência, especialmente dentro de um movimento no qual estão aparecendo muitos nomes importantes.
“Não nasci com talento de rima. Eu nasci predisposta à arte, é como eu vejo. Coloquei tempo, treinei e quando vi, estava tudo dando certo. Uma loucura também. Mas sempre treino, treino, treino, buscando novas informações, novas fontes, estudando. Isso é muito importante”, garante a rapper, que é também estudante de filosofia.
Tamanha dedicação tem como objetivo algo muito maior que vitórias em batalhas. A missão é compartilhar, de forma fácil, informações que conscientizem as pessoas ao seu redor. “Hoje, faço isso através do freestyle, das minhas letras, da minha presença. Traduzo questões importantes para incentivar as pessoas a também virem junto com a gente, simpatizar com o que estou falando e estar junto, lutando junto. Porque quanto mais gente lutando ao nosso lado, quanto mais pessoas são atingidas pelas informações, mais forte ficamos. É esse o objetivo. É uma revolução”, garante.
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