Cristina

Cristina estava desassossegada. O relógio já marcava quase meia noite, e nada de Cristiano chegar. O que era incomum. Normalmente ele costumava chegar em casa por volta de nove, dez horas. Era certo que havia avisado que chegaria tarde em casa nesse dia, mas… tão tarde, assim? Ela sabia que o rapaz tinha um compromisso ao qual não poderia faltar, e esse seria o motivo de sua ausência por tanto tempo. Mas ela esperava que fosse um atraso de umas duas horas. E já estava completando quase três de sua hora habitual…

Cristina resolveu sair no quintal, foi até o portão… já estava ficando aflita com a demora do rapaz… já era perto de uma hora da manhã, e nada do rapaz aparecer… o desespero tomava conta de seu ser… o que teria acontecido com ele?  Porque não chegava nunca? Porque não ligava para casa, para dar um sinal de vida? Bem, aí ela se lembrou que o telefone estava lá na sala, e se porventura tocasse, ela não ouviria, pois do portão até a sala era uma distância razoável…

Os ponteiros do relógio não paravam de caminhar…uma hora… uma e quinze… uma e meia… e nada de Cristiano aparecer. Ela resolveu ligar para o celular do rapaz… novamente, pois já tinha tentado umas trinta vezes, desde que o relógio marcara onze horas e ele não aparecera… como das outras vezes, a resposta era a mesma… “deixe seu recado”. Que deixar recado o quê!  O que ela realmente precisava era ouvir a voz de seu filho! Onde esse menino sem juízo se enfiara, Meu Deus? Onde ele estava, que não atendia telefone, não ligava para casa…  o que poderia ter acontecido com ele? Será que… não, era melhor não pensar em coisas ruins… pensar em coisas ruins atrai coisas ruins para a vida da pessoa… ela tinha que pensar que logo o rapaz estaria abrindo a porta, dizendo como sempre… “mamãe, cheguei!”

Cristiano era um rapaz tranquilo. Tinha dezessete anos, mas qualquer um que o visse diria que era mais velho. Isso por conta da barba que deixara crescer, o lhe dava a aparência de pelo menos uns dois anos a mais… alguns diziam que ele aparentava bem mais, na verdade. O rapaz trabalhava em uma gráfica… uma das poucas que restaram pela cidade. Seu trabalho era importante para a família, uma vez que seu salário ajudava, e muito, na manutenção da casa. Trabalhava das oito às dezessete horas, de segunda a sexta. Após seu expediente, ia para a escola, onde estava terminando o segundo grau. Não era seu costume se atrasar assim… era muito raro deixar de chegar em casa no horário. Se já tinha chegado tarde alguma outra vez? Sim, mas não tão tarde como nesse dia. Está certo que era sexta feira e ele não trabalharia no dia seguinte… mas ainda assim…

O rapaz avisara a mãe que não iria para a escola nesse dia, pois era aniversário de sua namorada, e ele queria levá-la para jantar fora e depois pegarem um cineminha… a mãe não gostou muito da ideia, mas fazer o que? Dali a alguns meses ele completaria dezoito anos, e seria legalmente dono de seu próprio nariz… e ele sempre foi um garoto ajuizado. Tanto é que, assim que completou quatorze anos, procurou incansavelmente uma colocação profissional, pois “precisava ajudar a casa”, como ele mesmo dizia. Cristina era separada do esposo desde que seu filho tinha uns oito anos. Além dele, tinha também mais duas meninas… a Crismara, com quinze anos e a Crisnara, com onze anos. Sim, ela não era muito boa para escolher nomes… mas, enfim… bem, as duas meninas estavam dormindo o sono dos justos, e Cristina está queimando os neurônios, tentando imaginar onde o rapaz poderia estar. Se ao menos ele atendesse o celular…

Quando o ponteiro acusou quinze para as duas da madrugada Cristina realmente ficou apavorada… a cidade era muito perigosa, seu bairro era muito perigoso… e se tivesse acontecido alguma coisa com o rapaz? O que seria dela? Como poderia conviver com isso? Cristina começou a rezar, pedindo a todos os santos que conhecia para que trouxessem seu filho em segurança para seus braços… o desespero da mulher era tanto, que estava a ponto de chorar… então… o clique do portão se ouviu… ela quase não acreditou… mas, sim…ouviu os passos que se projetavam pelo quintal, e reconheceu naquele som seu filho amado… o barulho da chave abrindo a porta da sala foi o som mais maravilhoso que ela poderia ouvir naquele momento. Então, calmamente, o rapaz entrou na casa… quando viu sua mãe de pé, a olhá-lo, não conseguiu segurar uma interjeição de espanto…

– Mãe?!

A mulher correu até o rapaz e o abraçou, quase o sufocando com as lágrimas de alívio que escorriam por sua face… 

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