Caso Genivaldo: julgamento de policiais rodoviários federais ainda não tem data para acontecer

Sergipano, que tinha esquizofrenia, foi trancado por policiais em uma viatura cheia de fumaça de gás lacrimogêneo durante abordagem na BR-101 em Sergipe. Os três agentes acusados pela morte
estão presos. Momento em que agentes da PRF jogam gás dentro de viatura com Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos
Reprodução/ BBC/Arquivo
Um ano após a morte de Genivaldo Santos, de 38 anos, durante uma abordagem de policiais rodoviários federais na BR-101 em Umbaúba (SE), o julgamento dos agentes William de Barros Noia, Kleber Nascimento Freitas e Paulo Rodolpho Lima Nascimento, envolvidos na ação, ainda não tem data para acontecer. A Justiça Federal de Sergipe determinou que eles sejam submetidos à júri popular, o que é questionado pelas defesas.
O sergipano, que tinha esquizofrenia, morreu após ter sido trancado no porta-malas de uma viatura e ser submetido à inalação de gás lacrimogêneo no dia 25 de maio de 2022. A ação que foi gravada por testemunhas teve repercussão internacional, após a ONU pedir agilidade na investigação.
Os policiais estão presos desde o dia 14 de outubro, após se apresentarem voluntariamente à Polícia Federal (PF). Eles são acusados pelos crimes de tortura e homicídio triplamente qualificado.
Para o advogado e presidente da OAB Sergipe, Danniel Alves, o caso Genivaldo marca a história jurídica do país.
“É um dos maiores casos de violação dos direitos humanos dos últimos anos, e o Poder Judiciário está dando uma resposta rápida e eficiente. A sensação é de que valeu a pena lutar tanto para chamar a atenção da gravidade desse episódio tão trágico”, disse.
Acusados de matar Genivaldo Santos
Reprodução/TV Globo
Sobre os crimes de tortura e homicídio triplamente qualificado imputados aos policiais e o rito do julgamento, o presidente da OAB explicou: “a pena prevista varia de seis a 30 anos de reclusão para o caso de condenação. A quantidade de pena é decidida pelo juiz, presidente do conselho de sentença, com base na decisão soberana dos jurados”.
Ainda de acordo com ele, a defesa dos policiais tem legitimidade na tentativa de não levar o caso a júri popular.
O que dizem as defesas da família e dos policiais:
Os advogados da família de Genivaldo acreditam que o julgamento será realizado em breve e que serão mantidas as acusações, em virtude das provas apresentadas e dos depoimentos das testemunhas;
A defesa do policial Paulo Rodolpho afirmou que durante a ação ele aplicou técnicas para contenção de distúrbio, e nunca quis , assumiu ou anuiu qualquer resultado fatal contra Genivaldo. Disse ainda que recorreu a instâncias superiores .
A defesa do policial William Noia, informou que o TRF5 em Recife está analisando recurso, e que há pleitos junto aos Tribunais Superiores em Brasília para que ele seja solto;
O g1 também procurou a defesa do policial rodoviário Kleber Nascimento Freitas, mas até o fechamento da matéria não obteve retorno.
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Genivaldo de Jesus Santos, morto durante ação da PRF, em Umbaúba (SE)
Arquivo pessoal/Arquivo
Andamento dos processos
Segundo a Justiça Federal em Sergipe, o Caso Genivaldo envolve três processos:
Uma ação penal movida pelo MPF referente aos crimes de tortura, abuso de autoridade e homicídio qualificado, que passou por vários trâmites foi encaminhada, no mês de abril, ao TRF da 5ª Região. De acordo com a Justiça Federal, somente depois de esgotados todos os recursos, e se confirmada a decisão de pronúncia, é que será marcado o Júri. No entanto, isso depende do resultado dos recursos;
Uma ação cível proposta por familiares de Genivaldo contra a União. O processo tramita em segredo de justiça por envolver menor de idade e questões familiares;
Uma Ação Civil Pública ajuizada pela Educafro Brasil e pelo Centro Santo Dias de Direitos Humanos contra a União. Na ação, pretende-se uma indenização por dano moral coletivo [isto é, não direcionado aos familiares de Genivaldo]. Bem como, modificações na atuação operacional da Polícia Rodoviária Federal de todo o Brasil, como o uso de câmeras corporais. O processo está suspenso a pedido das partes, para que negociem um possível acordo.
O g1 procurou a Polícia Rodoviária Federal para saber sobre o andamento do procedimento administrativo referente ao caso, mas até o fechamento da matéria não obteve retorno.
Família quer Justiça
Mãe e irmãs de Genivaldo Santos morto em abordagem policial em Sergipe
Joelma Gonaçalves/g1
A irmã de Genivaldo, Valdenise de Jesus Santos, disse que a família espera que os policiais sejam condenados. Em conversa com o g1 familiares e a viúva falaram sobre a saudade noites insones e espera por Justiça.
“O que eles fizeram tem que pagar dentro da cadeia. Eles tinham o treinamento deles, eles sabiam o que matava e não matava. O que eles fizeram ali, fizeram para tirar a vida dele”, disse.
Perícia sobre o caso
Perícia afirma que gases tóxicos causaram colapso no pulmão de Genivaldo
A perícia feita pela Polícia Federal durante as investigações concluiu que a vítima passou 11 minutos e 27 segundos em meio a gases tóxicos, dentro de um lugar minúsculo e sem poder sair da viatura estacionada.
Com a detonação do gás lacrimogêneo, houve a liberação de gases tóxicos, como o monóxido de carbono e o ácido sulfídrico. Os peritos atestaram que a concentração de monóxido de carbono foi pequena, mas a de ácido sulfídrico foi bem maior, e pode ter causado convulsões e incapacidade de respirar.
Segundo a perícia, o esforço físico intenso e o estresse da abordagem aceleraram a respiração de Genivaldo, e isso pode ter potencializado ainda mais os efeitos tóxicos dos gases. A perícia constatou qe os gases causaram um colapso nos pulmões de Genivaldo.
Veja a cronologia:
Cronologia: homem morre asfixiado por gás lacrimogêneo em viatura
Por volta das 11h do dia 25 de maio de 2022, Genivaldo foi abordado por três policiais rodoviários no km 180 da BR-101, em Umbaúba. Segundo depoimento registrado no boletim de ocorrência (BO), os agentes o pararam por não usar capacete enquanto dirigia uma motocicleta;
Imagens feitas por populares mostram quando os agentes pedem que ele coloque as mãos na cabeça e abra as pernas para a revista;
O sobrinho da vítima, Wallison de Jesus, diz que avisou aos policiais que o tio tinha transtornos mentais. Ainda de acordo com ele, os agentes encontraram uma cartela de um medicamento controlado no bolso do tio, que fazia tratamento para esquizofrenia há cerca de 20 anos. Também segundo a família, Genivaldo era aposentado em virtude dessa condição;
Wallison relata que o tio ficou nervoso e perguntou o que tinha feito para ser abordado. No BO, os policiais dizem que ele ficava passando a mão pela cintura e pelos bolsos e não obedecia às suas ordens e que, por isso, precisaram contê-lo. Segundo os agentes, os primeiros recursos foram spray de pimenta e gás lacrimogêneo;
Um vídeo mostra quando um dos agentes tenta imobilizar Genivaldo com as pernas no pescoço. No chão, ele é algemado e tem os pés amarrados;
Em seguida, Genivaldo é colocado no porta-malas do carro da PRF, que está com os vidros fechados. Os policiais jogam gás e fecham o compartimento. Genivaldo se debate, com os pés para fora do porta-malas, enquanto os policiais pressionam a porta;
No boletim de ocorrência, os policiais dizem que o homem teve um “mal súbito” no trajeto para a delegacia e foi levado para o Hospital José Nailson Moura, no município, onde morreu por volta das 13h;
O corpo foi recolhido pelo Instituto Médico-Legal de Sergipe e chegou a Aracaju às 16h58. Um laudo do órgão aponta que Genivaldo morreu por asfixia mecânica e insuficiência respiratória aguda;
Por volta das 18h, a Polícia Rodoviária Federal se pronunciou, informando ter aberto um procedimento para apurar o caso, que também é investigado pelas polícias Civil e Federal. O Ministério Público Federal em Sergipe também acompanha as investigações;
O corpo de Genivaldo foi sepultado em Umbaúba por volta das 11h do dia seguinte, 26 de maio. Ele deixou esposa e um filho e oito anos;
No fim da tarde, a PRF informou sobre o afastamento dos agentes envolvidos.

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