Contra preconceito, comunidade LGBTQIAP+ pede mais diálogo, humanização e respeito

No Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia, g1 traz relato das vivências de pessoas da região. Contra preconceito, comunidade LGBTQIAP+ pede mais diálogo, humanização e respeito.
Arquivo pessoal/g1
Nesta quarta-feira (17) é comemorado o Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia. Para falar sobre o assunto pela ótica de quem sente na pele e vive os desafios diários impostos pela sociedade, o g1 trouxe relato de pessoas da comunidade LGBTQIAP+.
São três olhares, de três gerações e siglas diferentes, mas um sentimento é unânime entre eles, de que apesar dos avanços, a comunidade segue sendo vítima de pessoas que reproduzem intolerâncias e preconceitos.
Kika Medina fala sobre a luta contra o preconceito.
Arquivo pessoal
‘Sou travesti’
Seja, trans, transsexual ou travesti, as pessoas que se reconhecem na sigla “T” ainda sentem na pela a rejeição, o afastamento e a falta de humanidade. Kika Medina, de 63 anos, por exemplo, presencia cenas de negação e intolerância quando se trata apenas de sua presença.
Kika conta que diferente das demais siglas, as pessoas trans ou travestis vivem, em sua maioria, marginalizadas na sociedade. São poucos os casos de pessoas que conseguem ingressar no mercado de trabalho ou ter uma vida minimamente digna.
Neste aspecto, mesmo após estar “calejada”, Kika que é engajada e presidente da Associação LGBTQIAP+ de São José dos Campos e região, diz que continua a sofrer preconceitos.
Kika Medina fala sobre a luta contra o preconceito.
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Recentemente, em um consultório médico a espera de uma cirurgia de catarata, Kika afirma que foi violentada verbalmente. Ela lembra que aguardava pelo atendimento com outros pacientes que fariam o mesmo procedimento e uma pessoa da equipe médica disse para passarem outros pacientes na frente e deixarem ela por último, pois precisariam “preparar o médico”.
Nesse momento, Medina se revoltou e reivindicou um atendimento humanizado. “Como assim o médico precisa estar preparado para me atender? Eu sou uma pessoa, como qualquer cidadão que tem direito à saúde”, contou por telefone em tom de revolta, mas sem perder o alto astral.
Para Kika, os atendimentos e serviços públicos em geral precisam ser mais humanizados. “O que falta é humanização. Políticas públicas devem ser criadas para humanizar o nosso acesso ao atendimento básico de qualidade. Antes de qualquer coisa, o profissional que lida com o público lida com pessoas”, disse.
Kika Medina fala sobre a luta contra o preconceito.
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“Será que esses profissionais estão mesmo preparados para colocar de lado todo o preconceito pessoal? Se tivéssemos, por exemplo, mais rodas de conversas, mais integração, talvez os serviços para a população fossem mais humanizados”, sugeriu.
Erica fala sobre a importância de sair da bolha para acolher a comunidade LBGTQIAP+.
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É preciso sair da bolha
Aos 23 anos, o estudante de jornalismo Eric Souza não tem o que reclamar. Ser gay foi naturalmente revelado a seus familiares e amigos, de forma espontânea e respeitosa. Ao contrário da maioria, Eric não sofreu preconceito ao longo de sua juventude. A escola, por exemplo, é um local de boas lembranças. Apesar de ter um convívio saudável com a família e amigos, Eric sabe que essa não é a realidade da maioria.
“A minha experiência é um uma. Eu não acredito que as coisas mudaram muito [nos últimos anos]. Eu tive um pouco de sorte, apenas. Porque eu sei que acontece coisas ruins com muitas pessoas e acho que o preconceito está em todo lugar”, disse.
Erica fala sobre a importância de sair da bolha para acolher a comunidade LBGTQIAP+.
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Para derrubar essa barreira espessa que distancia as pessoas uma das outras, Souza encara de forma positiva as retratações homoafetivas em filmes, séries e no audiovisual de forma geral. Para ele, quanto mais houver a possibilidade de se espelhar em boas histórias e estas atingirem pessoas de fora da comunidade LGBTQIAP+, maior será a chance de transformar o preconceito em amor.
“O medo de não viver um relacionamento saudável acho que mudou muito. Antes as pessoas não podiam viver um amor e hoje isso é diferente. Filmes, séries acho que impactam, sim, e de uma forma muito positiva. A gente espelha a nossa vivência no que vemos”, contou.
Erica fala sobre a importância de sair da bolha para acolher a comunidade LBGTQIAP+.
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“Além disso, eu acho que precisamos quebrar as bolhas. Na minha, as pessoas são inclusivas e não têm preconceitos. E, talvez, se outras pessoas tivessem mais contato com a minha bolha, as coisas começariam a mudar um pouco”, refletiu.
Elaine ao lado da família.
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Dois irmãos e duas mamães
Criada numa família católica e frequentadora da igreja do bairro onde morava, Elaine Cristina, de 30 anos, enfrentou o medo, a solidão e o preconceito através do amor. Aos 24 anos, logo após concluir o ensino superior e um ano e meio antes de se casar, Elaine revelou para sua família ser lésbica..
Antes de viajar, durante a madrugada, deixou uma carta para a sua mãe. Como a maioria, Elaine conta que a maior preocupação que a mãe tinha sobre a sexualidade da filha era em relação à sua segurança no mundo: “Ela era preocupada que eu sofresse”.
Com o tempo, a mãe e a família foram aprendendo a lidar com a novidade e a conviver com a Elaine, que passou a ter esse detalhe a mais. “Eles aceitaram até minha namorada em casa, pessoa que veio a se tornar minha esposa, posteriormente”, relata.
Já casada, Elaine fala que sempre teve o sonho de adotar e sua esposa, Priscila, de gerar. “Infelizmente o processo de inseminação artificial é algo muito caro, o que se tornou inviável para nós”, explicou.
Após amadurecerem a ideia e conversarem bastante, as duas recém casadas iniciaram o processo de adoção. O casal de irmãos foi batizado na Igreja Católica, assim como a mamãe coruja, que nunca deixou de frequentar os costumes religiosos. E nesse processo de viver como são, uma família normal, Elaine precisa lidar com perguntas e olhares indiscretos.
“Sou católica praticante e fico muito feliz de participar. Mas, sim, ainda vejo algumas pessoas nos olhando diferente. Já nos perguntaram ‘mas quem é o pai?’ e quando respondemos que somos duas mães, o olhar é diferente. Na escola tivemos sorte. Sempre enviam duas lembrancinhas de dia das mães”, contou.
“Eu acho que as pessoas precisam aprender a respeitar mais, julgar menos e ver que, como toda família, compostas por homens e mulheres, nós estamos apenas nos amando e cuidados de nossos filhos em família também”, ponderou.
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