Checagem: Ultradireita alega que mídia alemã “inflou” protestos

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Políticos da ultradireita e usuários de redes sociais na Alemanha espalham desinformação com postagens de fotos supostamente adulteradas pela imprensa.Foi um fim de semana de manifestações em toda a Alemanha: cerca de 1,4 milhão de pessoas foram às ruas em mais de cem locais diferentes para protestar contra o extremismo de direita e, em particular, contra o partido Alternativa para a Alemanha (AfD).

Os protestos foram desencadeados pela revelação da agência de jornalismo investigativo Correctiv , de que membros da AfD haviam participado de uma reunião secreta na cidade de Potsdam, em novembro, na qual se discutiu a “remigração”, ou expulsão de milhões de estrangeiros e cidadãos “não assimilados” da Alemanha.

De acordo com a Correctiv, a reunião também contou com a presença de neonazistas, empresários simpatizantes e também dois membros do principal partido de oposição da Alemanha, a CDU, de centro-direita.

Para a maioria dos alemães, as revelações reacenderam lembranças dolorosas do passado sombrio do país. A reunião de novembro aconteceu a apenas alguns quilômetros da mansão onde os nazistas discutiram, na Conferência de Wannsee, a “solução final” para o extermínio dos judeus europeus em 1942.

Os protestos do fim de semana passado foram acompanhados de uma enxurrada de postagens nas mídias sociais, com usuários compartilhando o que vivenciaram nas manifestações em todo o país.

Mas, como acontece com frequência nesse tipo de situação, também houve vários casos de desinformação, especialmente por parte de políticos da ultradireita e alguns usuários das redes sociais que questionaram o número de pessoas que participaram das manifestações.

Estes são três exemplos de desinformação relacionados aos recentes protestos na Alemanha:

Hamburgo estava tão cheia que as pessoas estavam paradas sobre o rio Alster?

Alegação: “O protesto em Hamburgo estava tão superlotado, de acordo com a [emissora pública alemã] ZDF, que as pessoas tiveram que ficar em pé sobre o Alster”, afirmou uma das principais lideranças da AfD, Björn Höcke, na plataforma de mídia social X, antigo Twitter, referindo-se ao rio que tem como parte mais famosa o lago de mesmo nome no centro da cidade do norte da Alemanha. O tuíteteve mais de 400 mil visualizações até a tarde desta segunda-feira.

Checagem da DW: Falso

Höcke, líder da AfD no estado da Turíngia, criticou a mídia alemã no X por publicar imagens do protesto em Hamburgo que, segundo ele, foram manipuladas para fazer a multidão parecer maior.

Também outros usuários sobrepuseram duas imagens do protesto em Hamburgo, uma publicada pelo governo da cidade e a outra pela ZDF . O rio Alster pode ser visto na primeira imagem, mas não na segunda.

Com base nessa justaposição, esses usuários alegaram que o número de participantes havia sido manipulado. Mas uma análise das duas imagens pode ajudar a entender que elas apenas mostram duas perspectivas do mesmo lugar.

A foto publicada pelo governo local foi tirada de um ponto mais alto, o que permite ver mais da cidade, incluindo o Alster. A imagem usada pela ZDF foi tirada de um ponto mais baixo, com um grande número de pessoas obstruindo a visão do rio.

Usuários do X também foram rápidos em explicar essas diferentes perspectivas e oferecer contexto adicional.

Esta animação ilustra claramente a questão:

Além disso, a agência de notícias alemã DPA reagiu à postagem de Höcke afirmando que ela havia feito a foto usada pela ZDF e que a imagem não havia sido manipulada.

Esse é apenas um dos vários exemplos em que usuários de redes sociais, especialmente simpatizantes da AfD, compartilharam fotos que eles alegaram terem sido adulteradas para fazer com que as aglomerações parecessem maiores.

Figurantes pagos participaram dos protestos?

Alegação: Este anúncio de emprego oferecendo dinheiro para figurantes interpretarem “manifestantes” numa gravação de vídeo foi compartilhado nas redes sociais, sugerindo que as pessoas haviam sido contratadas para participar das recentes manifestações.

Checagem da DW: Falso

De acordo com o anúncio, os participantes deveriam ter entre 18 e 35 anos de idade e receberiam 60 euros pelo trabalho. O anúncio acrescentava que os figurantes não precisavam memorizar nada porque se tratava “mais do efeito, para que a demonstração real parecesse um pouco mais cheia”.

No entanto, o anúncio foi publicado em 2022. O código-fonte da página, que pode ser visto clicando com o botão direito do mouse na página e escolhendo “visualizar fonte da página”, diz: “data de publicação: 13-10-2022”.

Uma pesquisa avançada no Google que limita os resultados a anteriores a 2024 também revela o anúncio de 2022.

Uma análise mais detalhada do site que publicou originalmente o anúncio também oferece algumas pistas. A empresa se chama JOBWRK e o expediente do site e os termos e condições gerais revelam que se trata de uma plataforma de empregos online para profissionais de áreas como atuação, dança e canto.

A página foi modificada em 22 de janeiro deste ano e agora inclui o seguinte esclarecimento: “Este anúncio foi publicado em 13/10/2022, com data de encerramento das inscrições em 18/10/2022, e não está de forma alguma relacionado às manifestações em Hamburgo de 19/01/2024.”

O diretor administrativo da empresa, Andreas Niederwipper, também confirmou em uma declaração por escrito à DW que o anúncio foi tirado de contexto e está “muito distante de qualquer protesto ou demonstração real”.

O provável objetivo por trás do uso descontextualizado do anúncio era semear a desconfiança em relação ao número e às motivações dos participantes dos protestos contra a extrema direita.

Houve também protestos em Copacabana?

Alegação: Um usuário, que se descreve como “um conservador”, publicou no X esta foto da praia de Copacabana lotada no Rio de Janeiro, com a seguinte legenda: “Até em Copacabana protestaram contra a AfD! Ou não?”

Checagem da DW: Falso

Obviamente não há notícia de que a famosa praia carioca estivesse cheia de pessoas protestando contra a extrema direita alemã.

Se tais protestos tivessem realmente ocorrido no Brasil, eles teriam sido notícia em todo o mundo e amplamente divulgados pela imprensa.

A provável intenção de quem publicou essa foto, com base nos comentários nas redes sociais, foi desmerecer a importância dos protestos na Alemanha e ridicularizá-los.

Uma busca reversa de imagens, por exemplo, no TinEye, fornece pistas sobre a origem da foto.

Vários meios de comunicação, incluindo o jornal britânico The Guardian e o jornal americanoLos Angeles Times, publicaram essa foto ou outras muito semelhantes para ilustrar uma visita do papa Francisco ao Brasil em 2013.

Silja Thoms e Joscha Weber contribuíram para esta análise.

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