Diversidade e desafios: empresas de Uberlândia desenvolvem ações para inserir pessoas trans no mercado de trabalho


Iniciativas vão desde vagas afirmativas até auxílio financeiro e jurídico na retificação de nomes sociais. Bandeira Trans
Celso Tavares/g1
Baixa escolarização, falta de qualificação técnica, preconceito e discriminação são alguns dos desafios enfrentados pela comunidade trans para encontrar espaço no mercado de trabalho de Uberlândia. As informações são da pesquisadora Sayonara Nogueira, uma das coordenadoras do Observatório LGBT+, que também atua como consultora de diversidade de gênero dentro de empresas.
Foi a experiência nas duas funções que possibilitou que Sayonara explicasse como empresas de diversos setores caminham a passos lentos, mas constantes, para mudar a realidade no município.
No Dia do Orgulho LGBT+, o g1 conversou com Sayonara e com representantes de empresas atuantes em Uberlândia que buscam, por meio de iniciativas de inclusão, tornar a inserção de pessoas trans no mercado de trabalho mais fácil. Confira mais abaixo.
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“Trabalho é humanização”
Parte do cotidiano de Sayonara é visitar corporações para trabalhar com os gestores, líderes e demais colaboradores sobre as temáticas que envolvem a diversidade de gênero. Para ela, a população trans enfrenta quadros graves de exclusões que se manifestam de diferentes formas e repercutem em todas as esferas, sobretudo, no mercado de trabalho.
“É preciso preparar o setor de Recursos Humanos e demais colaboradores, para que se sensibilizem para a necessidade um mundo mais inclusivo”, disse ela.
Esta preparação ocorre de diversas maneiras, mas em Uberlândia, empresas trabalham para ter pessoas trans no quadro de funcionários a partir da criação de vagas afirmativas e outras iniciativas que tornam o ambiente de trabalho mais seguro, quando estas se tornam parte do grupo.
“Em Uberlândia, empresas já têm pessoas trans trabalhando, os crachás respeitam o nome social e para aquelas que não têm nome e gênero retificado, muitas organizações dão incentivos para que façam o processo. Vejo também banheiros inclusivos, além do acesso à promoção de carreira que vai motivar e valorizar cada vez mais o colaborador, isso tudo impacta na imagem organizacional”, afirmou Sayonara.
“Colocar as pessoas em primeiro lugar”
Entre as empresas com esse tipo de trabalho está a Cargill, que tem unidade em Uberlândia. Segundo as diretrizes da multinacional, “colocar as pessoas em primeiro lugar” faz parte dos valores da empresa.
“Isso significa confiar e apoiar uns aos outros e inclui pensar na segurança emocional, com a criação de um ambiente em que qualquer pessoa seja capaz externalizar seu modo de pensar e interagir de maneira aberta e franca”, disse Sandra Athaydes, do Recursos Humanos da empresa.
Segundo ela, a Cargill criou um Comitê de Diversidade em 2016, uma das iniciativas do comitê é a rede Pride, que se empenha na promoção e inclusão LGBT+ por meio de networking, desenvolvimento e compartilhamento de conhecimento.
“Buscamos a construção de uma rede de relacionamentos, as pessoas trans estão consideradas nessa política, certamente”, relatou Sandra.
A empresa trabalha com vagas afirmativas, ou seja, destinadas a grupos minoritários e sub-representados.
“Todas as pessoas são bem-vindas, e muitas vezes o processo seletivo é o primeiro contato delas com a empresa. O respeito começa nessa abordagem que deve ser, acima de tudo, humana, inclusiva e acolhedora. Para que as pessoas trans se sintam seguras desde o começo e incentivadas a participarem”.
Além da inserção no mercado, o trabalho da multinacional continua para manter os colaboradores ativos e com possibilidade de crescimento dentro da corporação.
“Abrimos um projeto para desenvolvimento de pessoas diversas chamado INcluir, que começou no escritório em São Paulo com foco em pessoas com deficiência (PCDs), e depois teve o foco ampliado em Uberlândia, incluindo outros grupos minoritários. Durante 12 meses, essas pessoas são inseridas nas áreas com oportunidade de serem treinadas em atividades que até pouco tempo estariam fora do alcance delas. O plano é abrir as portas, permitir a entrada e apoiar o crescimento”, explicou Sandra.
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“Caminho para todos”
Presente em várias cidades do Triângulo Mineiro, o EcoRodovias também tem políticas com enfoque na diversidade de gênero e na equidade entre os colaboradores. Segundo o diretor-superintendente do grupo, Matheus Fernandes, as ações partem de um comitê.
“Temos um comitê que lida com as ações que envolvem todos os pilares e de diversidade e inclusão, por ele temos o programa Caminho para Todos, que abarca uma série de ações”, disse.
Entre as políticas criadas pelo programa criado em 2018, está o apoio jurídico e financeiro para a retificação do nome e gênero.
“Tivemos no ano passado colaboradoras tanto da Eco050 quanto da Ecovias do Cerrado que, com o apoio da empresa, puderam cuidar da documentação de forma facilitada. É um processo complexo, mas com apoio financeiro e jurídico, pode se tornar mais fácil.”
Ele explicou, ainda, que a empresa busca impactar externamente a comunidade onde atua.
“A gente lida com muitos usuários, com caminhoneiros e pessoas de todo o Brasil que passam por nossas rodovias. Então, a gente discute tanto do ponto de vista interno, pensando aqui nas nossas equipes, mas de que forma também a gente pode levar isso para fora. Para nos tornarmos uma empresa referência nesse tema dentro da nossa região”, afirmou Matheus.
“Acho que a liderança passou a entender o quanto isso é importante, o quanto isso é estratégico para a empresa.”
Resultados e desafios
As ações dos comitês nas empresas trouxeram resultados positivos, afirmam os representantes. A diversidade e a equidade entre os trabalhadores, para eles, possibilita inovação e indícios de que as corporações estão avançando.
“O ambiente mais diverso indica que ele é seguro para que todos se expressem e tragam suas melhores ideias, suas versões reais para dentro da empresa. Isso favorece a inovação e, como consequência, permite que a empresa continue avançando. Vale lembrar aqui que o impacto positivo não é apenas para a empresa, mas para os colaboradores trans que encontram um ambiente seguro, confiável e diverso onde podem trabalhar e buscar crescer”, explica Sandra, da Cargill.
“Nos últimos anos tivemos um trabalho de tornar a diversidade um processo, uma rotina da empresa e a partir daí conseguir expandir. Quando a gente vê novos colaboradores que chegam e falam, ‘nossa, como eu me senti bem, como me senti acolhido’, a gente vê está no caminho certo”, contou Matheus, da EcoRodovias.
Apesar dos resultados positivos dentro das empresas, há desafios para atingir novos colaboradores.
“A maior dificuldade é a falta de informação e conscientização, e isso não é tão simples de ser identificado, já que o preconceito aparece de formas óbvias e inconscientes. Muitas vezes, ouvimos relatos de pessoas trans sobre como não se sentem nem capacitadas para aquela vaga, e muitas vezes nem se inscrevem. O plano maior é continuar deixando claro que todos são bem-vindos”, finalizou Sandra.
Aém do corporativismo
Apesar das ações importantes das empresas, Sayonara explicou que a garantia de trabalho para todas as pessoas passa pela reorientação do Estado.
“Avançamos no campo nas políticas públicas, mas ainda são insuficientes, quando comparamos com o quadro de exclusão e violência que existe ainda no país. É preciso legislar em prol dos excluídos sociais que se deparam com pouco acesso a educação e saúde que impacta diretamente na busca de emprego e fere diretamente a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição Brasileira de 1988”, esclareceu.
Segundo Sayonara, as desigualdades sociais estão diretamente ligadas às condições de exclusão socioeconômicas.
“É preciso que a sociedade provoque um debate político-jurídico que demonstre a vulnerabilidade da população trans empregando esforços junto do Estado para a proteção dos direitos básico desta comunidade.”
O g1 procurou a Prefeitura de Uberlândia para saber se existem políticas públicas vigentes no município que abarquem a comunidade trans, o mercado de trabalho e a educação e aguarda retorno.
prefeitura de uberlandia
Prefeitura de Uberlândia/Ascom
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