Prefeitura de SP trava “guerra” com PCC contra loteamentos em área protegida

São Paulo – Áreas de proteção ambiental viraram “zona de guerra” na capital paulista. De um lado, fiscais municipais sobrevoam as regiões à procura de árvores derrubadas, máquinas aplanando terrenos ou construções erguidas do dia para noite. Do outro, criminosos correm para abrir novos loteamentos clandestinos em invasões coordenadas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

Segundo investigações, o PCC usa testas de ferro para invadir ou comprar terrenos a baixo custo – uma vez que, com novas construções proibidas por lei, aquela área se torna pouco atrativa para o proprietário original. Os bandidos, então, desmatam o local, constroem condomínios fechados e anunciam abertamente a venda de unidades ilegais em cartazes e páginas da internet.

A maior concentração de loteamentos irregulares é em áreas de manancial, às margens das represas Billings e Guarapiranga, na zona sul, mas o problema já se espalhou pela cidade. Monitoramento da Prefeitura mostra que atualmente há 1.030 ocupações desse tipo, em todas as regiões, que ameaçam o abastecimento de 9 milhões de pessoas.

O negócio é lucrativo e também serve para o PCC lavar dinheiro, dizem autoridades ouvidas pelo Metrópoles. Segundo estimam, o número de invasões em áreas protegidas cresceu 950% na última década. Se todos os lotes clandestinos fossem vendidos, o faturamento da facção superaria R$ 2 bilhões.

Rotina de medo e ameaças

Na tentativa de conter o avanço do crime organizado, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) determinou que equipes monitorem as áreas mais atingidas, toda semana, com helicópteros e drones. Na última ação, realizada na segunda-feira (8/5), foram apreendidos um caminhão e uma retroescavadeira em Parelheiros, na zona sul.

Fiscais da Prefeitura, no entanto, vivem uma rotina de medo e ameaças. Segundo relatam, é comum receber bilhetes anônimos no trabalho ou em casa após autuar uma área loteada. “Sabemos onde você mora”, é a mensagem mais frequente.

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Recentemente, dois empreendimentos clandestinos, ambos em Parelheiros, entraram na mira dos fiscais. Um deles é anunciado por uma vendedora de terrenos sem CNPJ, em que o responsável tem passagem por furto, roubo e receptação. Já o outro está ligado a um homem com condenação por porte de armas e tráfico de drogas.

“Estamos trabalhando em cenário de guerra”, diz o secretário executivo de Mudanças Climáticas, Antonio Fernando Pinheiro Pedro, responsável por coordenar as ações municipais na Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida). “Não se tratam de ocupações de movimentos de moradia, com quem até abrimos uma linha de comunicação. É criminalidade organizada”.

Operações contra o crime

De acordo com a Prefeitura, 100 ocupações irregulares foram desfeitas em áreas de manancial e 428 pessoas foram conduzidas para delegacias em ações da Oida, em 2022. As operações conjuntas ocorrem com apoio da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e da Polícia Militar Ambiental.

“Quando identificamos as áreas que estão sendo desbastadas ou sofrendo construções clandestinas, organizamos a operação em segredo”, diz Pinheiro Pedro. “Mesmo assim, não é raro que a gente se depare com um advogado com uma liminar genérica impedindo a ação. É uma situação muito complexa”.

Na quarta-feira (10/5), o secretário participou de reunião no Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC), da Polícia Civil de São Paulo, onde correm ao menos dois inquéritos que ligam as ocupações irregulares à atividade do PCC.

No fim de abril de 2023, o departamento policial também foi responsável por apurar uma denúncia de cemitério clandestino da facção no Jardim Ângela, na zona sul, próximo à represa Guarapiranga.

Problema só cresce

Um dossiê do ex-vereador Gilberto Natalini mostra que, até abril de 2020, o crime organizado já havia aberto 48 mil lotes clandestinos, desmatado 160 áreas protegidas e derrubado 1,2 milhão de árvores. “Esse processo continua até hoje”, afirma.

Segundo o ambientalista, o avanço sobre as áreas protegidas tem se acentuado desde 2014, a partir da gestão Fernando Haddad (PT), cenário que prosseguiu com João Doria (sem partido) e Bruno Covas. “Houve uma desmobilização das Operações de Defesa das Águas, que só foi retomada recentemente, com Ricardo Nunes, após questionamento do Ministério Público”, diz.

“Já na época conseguimos identificar muito bem o envolvimento do PCC. Em um dos empreendimentos, eles pagaram R$ 5 milhões por uma área de 150 mil m², remanescente de Mata Atlântica, e construíram mil lotes para revender a R$ 37 milhões”, diz o ex-vereador.

Em 2019, Natalini tentou emplacar uma CPI sobre o tema na Câmara Municipal de São Paulo. A proposta, no entanto, só recebeu 24 de 28 votos necessários.

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