“O fascista é o alegado antifascista que trata de fascista quem não é”

Sou neto de um refugiado do fascismo e fico abismado com a facilidade com a qual certos brasileiros chamam adversários políticos de “fascistas”. Mas fazer o quê? Muitos não sabem nem mesmo escrever corretamente a palavra, imagine saber o conceito. Só poderiam ter mais respeito pela memória de quem teve a vida destruída pelo fascismo, porque jamais ocorreu nada no Brasil redemocratizado — nada, absolutamente nada — que se compare ao terror fascista. O 8 de janeiro? Foi um ato terrorista grave e abilolado. Não foi, porém, a Marcha sobre Roma.

Outro dia, um político de língua muito solta (há algum que não a tenha neste momento?) vangloriou-se no Twitter de  “duas enormes lutas da minha vida política: contra o coronavírus e contra o nazifascismo”. O sujeito nasceu em 1968. Não tem idade nem mesmo para ter lutado contra a ditadura militar, veja você. Pode?

Não pode. Quem combateu o nazifascismo foram os pracinhas da Força Expedicionária Brasileira, na Segunda Guerra Mundial, depois que o ditador Getúlio Vargas, admirador de Benito Mussolini, viu-se obrigado a virar casaca e apoiar os Aliados. O curioso é que Getúlio Vargas se tornaria ícone da esquerda brasileira, espectro ideológico do qual o autor do tuíte faz parte. Ou talvez não seja tão curioso.

Há gradações no autoritarismo, e o fascismo,  assim como o nazismo e o comunismo, é um totalitarismo. Em regimes totalitários, na qual o autoritarismo é elevado à enésima potência, não existem partidos de oposição, não existe Judiciário nem sequer com aparência de independente, não existe nenhuma liberdade de expressão — e há uma polícia política que controla os cidadãos até na sua vida privada. Sob uma ditadura totalitária, não há oposição consentida e sambista cantando que amanhã vai ser outro dia.

Como o fascismo nasceu na Itália, berço desse totalitarismo, achei por bem terminar com uma frase de um grande autor siciliano, Leonardo Sciascia. Datada de 1979, ela é apropriada para emoldurar esse “fascismo” nosso de cada dia, que agora sai levianamente da boca de brasileiros que nunca o experimentaram. Quando Leonardo Sciascia a escreveu, a Itália vivia os anos de chumbo do terrorismo de esquerda, principalmente, e o adjetivo “fascista” era empregado por esses criminosos ideológicos contra os seus alvos, como justificativa para cometer barbaridades. A frase é a seguinte:

“O mais belo exemplar de fascista que se pode encontrar hoje (recomendamos aos peritos o maior cuidado em sua descrição e classificação) é o alegado antifascista que se dedica a tratar de fascistas os que não o são.”

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