Mulheres saem da informalidade e investem nos próprios negócios com ajuda de financiamento social e capacitação, em Fortaleza

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Calçados, vasos de planta e churrasquinho. Os setores são variados, mas encontram no sonho do empreendedorismo um ponto em comum. Juliana Vieira trabalha com carrinho de churrasco na Praia de Iracema, em Fortaleza.
Entre as barreiras de gênero e os desafios econômicos, são muitos os obstáculos que precisam ser superados por mulheres que decidem empreender. Assim, apoio e orientação sempre surgem como bem-vindos. Em Fortaleza, mais de 7 mil mulheres já receberam crédito orientado do programa “Nossas Guerreiras”. O benefício, que também fornece qualificação profissional, ajuda as participantes a regularizar a situação profissional, mas também a continuar o próprio negócio — o que para muitas também é sonho.
Uma delas é Juliana Vieira, que possui um carrinho de churrasco, há 18 anos, na Praia de Iracema, um dos pontos turísticos mais movimentados da capital. Contudo, durante muito tempo trabalhou irregularmente. Foi após decidir participar do programa que ela encaminhou a regularização do serviço.
“Eu fiquei sabendo do edital da prefeitura, porque a gente trabalhava irregular e nunca conseguia uma autorização. Quando a fiscalização aparecia, a gente precisava sair correndo. No começo, foi muito difícil”, disse a empreendedora. Ela participou do programa em 2022, e recebeu R$ 3 mil — valor máximo — de crédito orientado.
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Juliana Vieira trabalha com um carro de churrasquinho na Praia de Iracema, em Fortaleza.
Thiago Gadelha/SVM
Juliana disse que a renda que ela obtém com o marido é a principal da casa — onde também moram dois filhos. Ela conta também que, após a regularização, se tornou Microempreendedora Individual (MEI) e, inclusive, empregou um funcionário de carteira assinada. Além do carrinho de churrasco, ela e o marido também trabalham com um de bebidas, para eventos privados.
Um dos requisitos para inserção no programa é participar de uma capacitação gerencial voltada para elaboração de uma proposta de negócios. “É muito importante a gente se capacitar, para ficar antenada e sempre informada sobre o que está acontecendo para investir nos próprios negócios, e melhorar cada vez mais”, disse Juliana.
O Ceará registrou 435.861 MEIs até o fim de abril, segundo o Portal do Empreendedor. 210.603 são em Fortaleza. No programa Nossas Guerreiras, os principais setores das beneficiárias são comércio, gastronomia, beleza/estética, artesanato e serviços.
‘Isso me reanimou’
Suliane Silva decidiu empreender após precisar sair do emprego por motivos de saúde, em Fortaleza.
Arquivo pessoal
A participação no programa, para a empreendedora do ramo de calçados, Suliane Silva, foi uma das maneiras de manter o sonho do próprio negócio vivo — algo que ela precisou optar também por questões de saúde.
Ela trabalhou nos ramos de call center e supermercado, mas saiu deste último após ser diagnosticada com fibromialgia, em 2020. Ela optou por sair do emprego devido aos impactos da doença e o surgimento da pandemia de Covid-19.
“Só que eu não podia ficar dentro de casa sem fazer nada, sem ter nenhuma renda. Eu já estava acostumada a ter minha própria renda. Aí veio a ideia de vender alguma coisa, mas eu tinha dúvida sobre o que”, relembrou Suliane.
Ela disse que a ideia dos calçados surgiu após conhecer um casal que produz os itens. Para o início do negócio, ela investiu o dinheiro que recebeu após sair do emprego de carteira assinada. Contudo, devido a momentos de dificuldade financeira durante a pandemia, Suliane precisou pausar as vendas, até que conheceu o programa Nossas Guerreiras em setembro de 2022.
“Isso me reanimou. Eu estava pensando em voltar a trabalhar de carteira assinada, e deixar meu sonho de empreendedora adormecido. Só que o programa fez despertar de novo”, declarou. A empreendedora mora com três filhos e o marido em Fortaleza.
Suliane, que também é MEI, contou que, após o financiamento, conseguiu contrato com um representante de grandes marcas. Então, atualmente, ela vende calçados da própria marca e de outras. Contudo, ela tem planos ainda maiores.
“A minha renda ainda não é a principal. Infelizmente, ainda não chegamos nesse patamar, mas eu espero chegar e retribuir tudo o que foi feito por mim”, planejou a empreendedora, que também recebeu R$ 3 mil de crédito orientado.
Crédito orientado
Beneficiárias do Nossas Guerreiras participam de feira em Fortaleza.
SDE/Reprodução
A gestora do programa de Educação Empreendedora e Empreendedorismo Feminino do Sebrae-CE, Mônica Arruda, explicou que, comumente, os negócios são iniciados por motivações como sonho ou a necessidade de empreender. Para ambos, há dois pontos que ela considera muito importante.
“O primeiro é a capacitação, para que ela passe por um período de formação sobre gestão de negócio e planejamento; para se sentir mais segura da ideia que vai implementar”, orientou.
“A gente sempre diz que a melhor opção é o crédito orientado, planejado. Quando o crédito é tomado para aquele negócio, e se faz uma boa gestão financeira a partir dele, aí sim é benéfico”, complementou Mônica.
Nesta perspectiva, o secretário de Desenvolvimento Econômico de Fortaleza, Rodrigo Nogueira Diogo, avaliou de forma positiva os quase três anos de funcionamento do “Nossas Guerreiras” na capital. “É o maior programa de capacitação no Brasil, capacitando muitas empreendedoras que estão tendo sucesso. São cursos de várias matizes, desde precificação de produto até marketing digital”, destacou.
Desde dezembro de 2021 o Programa Nossas Guerreiras já capacitou 30.109 mulheres de todos os bairros da cidade de Fortaleza. Delas, 7.535 receberam crédito orientado de até R$ 3 mil. Já entre os bairros, os dez com maior participação no programa ficam na periferia da cidade; confira:
José Walter: 430 mulheres
Bom Jardim: 292 mulheres
Mondubim: 233 mulheres
Jangurussu: 214 mulheres
Bom Sucesso: 212 mulheres
Canindezinho: 166 mulheres
Barra do Ceará: 157 mulheres
Passaré: 156 mulheres
Granja Portugal: 148 mulheres
Vila Velha: 145 mulheres
“A gente entende que assim está fortalecendo o empreendedorismo de bairro, e diminuindo a diferença em termos de conhecimento da nossa população”, complementou o secretário municipal.
Empreender enquanto mulher
Bruna Richely e Fabiane Moreira, casal de empreendedoras de Fortaleza.
SDE/Reprodução
“Duvidam muito da capacidade de administrarmos nossas próprias empresas e de estarmos em cargos de lideranças. É cansativo ter sempre que provar que somos capazes, isso às vezes desanima. É preciso sempre revigorar e lutar contra esse sistema altamente machista que vivemos”, esse é o desabafo de Bruna Richely, empreendedora do ramo de plantas e vasos, que também fez parte do programa Nossas Guerreiras. Ela também iniciou o próprio negócio durante a pandemia de Covid-19, em junho de 2020.
“O programa capacita e ajuda mulheres que não tem condições de iniciar seu próprio negócio, pela falta de conhecimento e investimento. No meu caso, o programa foi ótimo para expansão”, detalhou a empreendedora. Bruna também é MEI e, entre os motivos para o cadastro, ela aponta vantagens como formalização, credibilidade com clientes e fornecedores.
O casal criou a loja de vasos e plantas em junho de 2020, durante a pandemia de Covid-19.
Arquivo pessoal
Os desafios que surgem devido ao gênero são percebidos também por Mônica Arruda. “Eu acredito que existe o crescimento de negócios liderados por mulheres, porém há muitos desafios. Toda a questão de gênero, às vezes a própria percepção dela em não ser capaz, a questão da autoconfiança”, comentou.
“É preciso trabalhar a liderança e a questão mais comportamental e empreendedora da mulher, para que ela consiga vencer os receios, o medo de correr risco, de não dar conta das atividades pessoais, familiares e também do negócio”, complementou Mônica.
“A melhor resposta é provar que somos muito mais que qualquer preconceito. Eu e Fabiane, minha sócia, estamos sempre nos inspirando em outras mulheres e fortalecendo nossa rede de apoio”, complementou a jovem empreendedora, que administra a loja junto à esposa, Fabiane Moreira. O negócio é a fonte de renda principal da casa.
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