Parte da culinária de Blumenau, pesquisa revela como é o consumo de cuca em cidades do Brasil

Famosa na culinária de Blumenau, a cuca pode ser feita de diferentes formas e sabores. A iguaria carrega tradição e cultura trazidas pelos imigrantes germânicos durante o século XIX. Uma pesquisa de doutorado desenvolvida pela Furb (Universidade Regional de Blumenau) revelou como é o consumo do alimento em diferentes cidades do país.

Pesquisa sobre consumo de cuca: iguaria cortada em pedaços em cima de mesa de café

Parte da culinária de Blumenau, pesquisa revela como é o consumo de cuca em cidades do Brasil – Foto: Paôla Dahlke/Reprodução ND

O estudo foi realizado por meio do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, com moradores das cidades de Blumenau (SC), Domingos Martins (ES) e São Leopoldo (RS), que receberam imigrantes alemães há 200 anos.

Conduzida pela pesquisadora Daniela Matthes, doutora em Desenvolvimento Regional, a pesquisa revelou que o consumo de cuca segue sendo amplamente difundido, mas que o hábito e habilidade de produzir o alimento de forma caseira apresentam sinais de declínio, e praticamente desapareceram da cidade gaúcha.

A pesquisa, que teve como orientador o professor Maiko Rafael Spiess, doutor em Política Científica e Tecnológica, apontou que o saber fazer cuca em Blumenau ainda é presente, embora também apresente sinais de queda.

Como é consumo de cuca em diferentes cidades do Brasil

Na cidade catarinense, que detém o recorde de maior cuca do país, a iguaria é consumida tanto em padarias e cuqueiras, quanto em ambientes domésticos.

 Famosa cuca de Blumenau que detém o recorde de maior do Brasil, com mais de 199 metros

Pesquisa sobre cuca: Blumenau detém recorde de maior iguaria feita no Brasil – Foto: Moisés Stuker NDTV

Já em Domingos Martins (ES), a cuca feita em casa é predominante, enquanto em São Leopoldo (RS), o hábito de produzir a iguaria em ambiente doméstico praticamente desapareceu.

Em entrevista para a NDTV, Daniela Matthes explicou que desenvolveu sua dissertação de mestrado pesquisando a respeito da cuca no Médio Vale do Itajaí e o que ela representa para o desenvolvido da região. Ela seguiu com o estudo sobre a iguaria em seu doutorado.

“Só que aí eu resolvi comparar o que representa a cuca ou os derivados do Streuselkuchen, que é de onde veio a cuca, de onde derivou, então eu fiz um comparativo”, disse.

A pesquisadora avalia o atual estágio de difusão do saber fazer e do consumo de cuca, e compreende que é preciso elaborar políticas públicas voltadas à preservação da iguaria, além de contribuir para um eventual processo de transformação da cuca em patrimônio imaterial ou alimento com indicação geográfica.

“Cada família vai ter a sua receita, cada cozinheira vai ter a sua receita e não tá errado, a cuca tem muitas possibilidades. As receitas que tem dentro das famílias ainda são muito importantes para a manutenção do que a gente chama de saber fazer, que além do consumo em si, também saber fazer essa receita é muito importante pra manutenção dessa cultura”, completou.

De acordo com Daniela, quanto mais área rural e pequenas famílias produtoras presentes, mais forte é o hábito ou a prática de comer e fazer cuca.

“Essas famílias agricultoras têm que ser muito incentivadas a continuar com essas tradições de fazer e vender essas comidas tradicionais. Acho importante que o poder público inclua essas famílias nas políticas públicas que envolvam a promoção e a venda da cuca e outras comidas que a gente entende que são tradicionais da nossa região, para que essa cultura se mantenha e se perpetue”, enfatizou Daniela.

A  pesquisa apresenta uma análise de como cada uma das três cidades se desenvolveu em relação ao consumo do alimento e o que contribuiu para o atual cenário.

O panorama feito pela pesquisadora indica forte associação entre o nível de urbanização dos municípios e a preservação do hábito de produzir a iguaria em ambiente doméstico.

Em Domingos Martins (ES), onde predomina o saber fazer da cuca, é um município predominantemente rural, enquanto São Leopoldo (RS) é quase completamente urbano.

A forma como o turismo explora a cultura germânica também influência o cenário identificado na pesquisa. Em Blumenau (SC) e Domingos Martins (ES), há políticas públicas que exploram a culinária como atrativo turístico. Em São Leopoldo (RS) o aspecto é ausente, onde é adotado uma perspectiva mais pluralista em relação às etnias.

Formas com massas de cuca prestes a ser levada para o forno

Iguaria é uma das mais conhecidas na culinária germânica – Foto: Lucas Antônio NDTV

Diferentes tipos de cuca foram identificadas em pesquisa da Furb

A pesquisa identificou seis tipos de derivados do Streuselkuchen nas três cidades brasileiras, que tem em comum a produção de massas doces feitas com fermento biológico ou químico, e com cobertura de farofa doce.

Na cidade catarinense, a cuca é comumente feita com massa baixa, com ou sem recheio, assada em forma retangular de laterais baixas. Já no ES, os moradores produzem e consomem três tipos de derivados:

  • Pão Curra: massa alta e estreita, produzido com fermento biológico e coberto por açúcar e canela;
  • Simftbroud: massa estreita e baixa feita com fermento biológico e cobertura de açúcar e canela;
  • Streuselkuchen: massa baixa assada em forma retangular, recheada com frutas e coberta com farofa de trigo, açúcar e canela.

No Rio Grande do Sul, foram identificados dois tipos:

  • Cuca tipo pão:  com massa alta produzida com fermento biológico e coberta com farofa (forma mais consumida no município, de acordo com os informantes);
  • Cuca de massa baixa coberta por frutas e farofa doce, menos comum.

Tradição gastronômica passada de geração em geração

A cuca faz parte da culinária típica trazida pelos imigrantes há dois séculos, sendo passada de geração para geração. A produção da iguaria e seu cheiro característico remete à infância de pessoas como Graciela Custódio, empresária que adora produzir o alimento em seu tempo livre.

“Eu gosto de quando a comida tem história. Então, isso lembra minha infância, lembra quando eu via aquela cuca crescendo em cima do fogão à lenha e o gostinho da raspinha do limão na farofa. Quando eu sento e como uma cuca que eu fiz, eu sempre vou lembrar de alguma coisa da minha infância”, contou em entrevista à NDTV.

A variedade de sabores também foi algo apontado pela empresária, que hoje em dia se aventura com receitas diferentes, seguindo o que seu coração manda.

“Hoje eu tenho vontade de comer uma cuca de frutas vermelhas, amanhã eu estou com vontade de comer uma cuca de maçã com calda de caramelo ou de pêssego, então todo dia é um dia. Ás vezes eu misturo, dou uma editada no que eu comi na rua e trago pra casa pra criar novos sabores”, contou.

Iguaria produzida por Graciela - Paôla Dahlke/Reprodução ND

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Iguaria produzida por Graciela – Paôla Dahlke/Reprodução ND

Empresária é amante de cuca e se aventura com novos sabores - Paôla Dahlke/Reprodução ND

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Empresária é amante de cuca e se aventura com novos sabores – Paôla Dahlke/Reprodução ND

Entre os sabores novos que surgiram no “caderninho de receitas” está o de amora silvestre, aquela que costumava comer na infância, direto do pé. Um momento inesquecível para Graciela foi quando, por meio da iguaria, despertou memórias felizes em sua tia.

A receita de cuca de coco, foi passada e sua avó para seu pai, que depois passou para ela.

“Um dia eu fiz essa cuca e fui visitar a filha da minha avó que morava em Itajaí. Quando ela comeu, começou a chorar, e chorando ela me dizia que lembrava de tudo, de todas as coisas da infância dela que estavam ligadas naquele pedaço de cuca de coco”, recordou.

Assim como para Graciela, muitas famílias seguem com a tradição de fazer e cultivar a cultura de produzir e consumir a famosa cuca, que remete às mais belas recordações por meio da cozinha afetiva.

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