Pilastra onde ônibus bateu tem mensagem do Profeta Gentileza a motoristas


‘Dirija a vida e seu carro com gentileza’, diz o escrito. Uma das hipóteses é que o condutor tenha passado mal ao volante. Pilar onde BRT bateu tem mensagem do Profeta Gentileza
Reprodução/TV Globo
A pilastra onde um ônibus do BRT bateu na manhã deste sábado (21), deixando cerca de 60 feridos, faz parte dos Escritos do Caju, conjunto de mensagens que José Datrino, o Profeta Gentileza (1917-1996), deixou nos anos 1990.
O pilar do acidente diz: “Motoristas, amor do Gentileza: dirija a vida e seu carro com gentileza, que é Deus Nosso Pai no pensamento”.
Até a última atualização desta reportagem, não se sabia o que tinha causado o acidente. Uma das hipóteses é que o condutor tenha passado mal ao volante.
O acidente
Ônibus do BRT bate em pilastra do Gasômetro
O coletivo fazia a linha 60 (Deodoro-Gentileza) e estava quase chegando ao terminal na Zona Portuária quando, por volta das 6h, bateu em um dos pilares do Elevado do Gasômetro. Pelo menos 64 pessoas ficaram feridas, 3 delas em estado grave.
O motorista ficou preso às ferragens e só foi retirado após 3 horas de trabalho dos bombeiros. Douglemar da Silva Rocha era um dos feridos graves.
Bombeiros de 3 quartéis — Central, Benfica e Vila Isabel — foram acionados. Os feridos foram levados para os hospitais Salgado Filho, no Méier; Souza Aguiar, no Centro; Evandro Freire, na Ilha do Governador e Miguel Couto, na Zona Sul.
Bombeiros tentam retirar motorista de BRT das ferragens
Reprodução/TV Globo
O Profeta Gentileza
O Profeta Gentileza ganhou fama justamente naquela região, onde eternizou no concreto mensagens que viajaram o Brasil e o mundo.
Mas José Datrino, o futuro profeta carioca, nasceu no interior paulista, em Cafelândia (SP), num 11 de abril, dentro de uma família humilde de agricultores. Puxou carroça até conseguir montar uma transportadora. Já no Rio, ganhava a vida fazendo fretes nas proximidades da Rodoviária.
José Datrino, o Profeta Gentileza
Reprodução/TV Globo
Pai de cinco filhos, Datrino largou tudo para pregar a paz, em 1961, sensibilizado por um incêndio que matou 400 pessoas num circo em Niterói, na Região Metropolitana. Foi, então, que passou a atender por Gentileza ou Jozze Agradecido.
“Na verdade, ele não perdeu nenhum familiar na tragédia. Essa lenda acompanha a figura de Gentileza até hoje. O Profeta dizia ter ouvido vozes que o mandaram abandonar tudo e seguir para o local da tragédia, no intuito de confortar os que sofriam com o desastre”, descreveu José Marcos Barros Devillart, na dissertação sobre Datrino defendida no Instituto de Letras da Universidade Federal Fluminense em 2015.
“[Gentileza] Estabeleceu-se no local do incêndio com um de seus caminhões, que se tornou a sua casa. Transformou o local da tragédia em um grande jardim, pois relacionava o circo ao mundo. O mundo era o circo queimado, que deveria ser ‘reflorestado’ de boas intenções, e suas flores representavam essa vida no novo mundo que nascia”, prosseguiu.
Restauração dos escritos no Terminal Intermodal Gentileza
Reprodução/TV Globo
A tal figura exótica fez o ex-empresário ser internado num manicômio três vezes. De bata branca e barba longa, com um galhardete pedindo aos “filhos” do mundo um pouco de gentileza, o profeta era conhecido de quem pegava a barca Rio-Niterói ou chegava à Rodoviária. Mas atuou também em cidades da Baixada Fluminense, em São Gonçalo e chegou a ir a outros estados levar sua mensagem.
“Ele era uma figura exótica, tido como louco. A primeira vez que conversei com ele foi para tentar entender a vida por trás daquela aparente loucura”, conta Leonardo Guelman, professor de artes da Universidade Federal Fluminense (UFF) e dono de uma tese e dois livros sobre Gentileza.
E sua palavra principal foi a que adotou como nome. “Gentileza gera gentileza”, repetia Maria Alice Datrino, 65 anos, sua filha mais velha, que conta que a família, a princípio, não aceitou a mudança brusca de vida do pai. “Um dia ele falou: ‘Seu pai agora só pensa numa coisa, não quero coisas materiais, só espirituais’”, lembra ela. Com a saída do pai de casa, a mãe também se foi. Os filhos se espalharam em casas de parentes, e Datrino passou a viver de seu benefício do antigo INPS.
Sua saúde começou a se fragilizar em 1993, quando uma queda lhe causou uma fratura na perna. A dificuldade de locomoção foi agravada por problemas circulatórios e ele, aos poucos, foi diminuindo o ritmo de sua rotina. Gentileza voltou para o interior de São Paulo no fim da vida. Morreu aos 79 anos, em Mirandópolis.
Nos anos 1990, a prefeitura apagou e cobriu todas as suas pinturas de gentileza nos muros com tinta cinza. Mas, posteriormente, as mensagens foram restauradas. Em 2000, as 56 pilastras pintadas com seus escritos foram tombadas como patrimônio cultural da cidade.
As mensagens
Em seus principais ensinamentos, Gentileza propunha trocar as palavras ‘obrigado’ por ‘agradecido’, e ‘por favor’ por ‘por gentileza’. A mudança, explica o profeta, é porque ninguém é obrigado a nada e devemos ser gentis uns com os outros, além de nos relacionar por amor e não por favor.
Nos escritos das paredes da Avenida Brasil, ele dobra algumas letras das palavras. Todas com uma explicação própria. Amor, por exemplo, levava três ‘R’, quando escrito por ele. Isso porque, segundo o profeta, só o amor material se escreve com um ‘R’. “Amor universal se escreve com três ‘R’: um ‘R’ do Pai, um ‘R’ do Filho, um ‘R’ do Espírito Santo – AMORRR”, costumava dizer.
Adicionar aos favoritos o Link permanente.