Luta de dissidentes russos contra Putin reúne rebeldes de extrema direita a anarquistas, afirma líder de grupo

Pouco se sabe sobre a extensão e a formação desses grupos paramilitares que estariam apoiando o exército ucraniano em frentes de batalha desde o ano passado. Serviços de resgate trabalham para ajudar vítimas de explosão na cidade russa de Belgorod
Alexey Stopichev/BelPressa/Handout via REUTERS
Um ataque foi orquestrado por dois grupos armados de paramilitares russos na região de Belgorod, oeste da Rússia, na última segunda-feira (22). A incursão, em apoio à Ucrânia, é reivindicada como uma ação bem-sucedida das tropas do Corpo de Voluntários Russos (RDK) e da Legião “Liberdade da Rússia”. Entre os combatentes que lutam contra seu país, há desde membros da extrema direita até anarquistas, relata o grupo Conselho Civil, que apoia a formação de paramilitares contra o “regime terrorista russo”.
Nessa quarta-feira (24), o fundador do Corpo de Voluntários Russos, Denis Kapustin, figura conhecida da extrema direita russa, comemorou o “sucesso” da incursão que, segundo ele, evidenciou a falta de preparação das tropas de Moscou.
Os observadores internacionais consideram que essa foi a maior e mais longa operação militar realizada em território russo desde o início do conflito contra a Ucrânia.
No entanto, ainda pouco se sabe sobre a extensão e a formação desses grupos paramilitares que estariam apoiando o exército ucraniano em frentes de batalha desde o ano passado.
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A RFI conversou com Anastasia Sergeeva, a cofundadora do Conselho Civil, instituição que reúne fundos para a formação de combatentes dissidentes russos e apoia o RDK e outros grupos paramilitares, como o Batalhão Siberiano. Segundo ela, entre os voluntários há diferentes perfis de descontentes com o regime russo, de nacionalistas a anarquistas, de muçulmanos a ortodoxos. O grupo Conselho Civil considera que o governo de Vladimir Putin é um regime terrorista e que “a remoção de terroristas do poder requer o uso de força armada”.
Confira trechos da entrevista: 
RFI: Quando foi criado o Corpo de Voluntários Russos?
Anastasia Sergeeva: O RDK é uma seção da Legião Internacional do Ministério da Defesa da Ucrânia. Não é uma empresa militar privada – como a milícia Wagner – ou um movimento partidário. É uma unidade militar da mesma forma que o regimento Kalinovsky, o batalhão georgiano e outras unidades da Legião Ucraniana Internacional. O núcleo do RDK é formado por cidadãos da Federação Russa que lutaram no Batalhão Azov. A eles se juntaram aqueles que estavam na Ucrânia no início da guerra.
RFI: Quais são as funções do Conselho Civil? Como a Ucrânia reagiu ao recrutamento de voluntários?
A.S.: A ideia do Conselho Civil [cujos membros não são conhecidos publicamente] nasceu nos primeiros dias da guerra. Os fundadores são pessoas que entenderam imediatamente que não tínhamos tempo a perder com discussões. Os primeiros contatos com a Ucrânia ocorreram em março do ano passado, mas após os eventos em Bucha e Irpin, Zelensky aprovou um decreto proibindo a entrada de cidadãos russos na Ucrânia, o que atrasou consideravelmente o processo.
Ajudou-nos muito o fato de Denis Sokolov, um pesquisador do Cáucaso muito famoso e respeitado entre os muçulmanos, ter sido um dos cofundadores do Conselho Civil. Isso nos permitiu estabelecer relações com o comandante do batalhão da Crimeia, Isa Akaev. Agora está claro que somos aliados da Ucrânia.
No último outono, fizemos um acordo com o comando do exército ucraniano de que o RDK se tornaria uma plataforma para os voluntários que recrutamos fora da Ucrânia. Desde o início de 2023, houve várias ondas de voluntários. Recentemente, um de nossos voluntários foi morto (Dmitri Petrov, antifascista e anarquista da Rússia, doutor em história e antropólogo, morreu durante a defesa de Bakhmut no final de abril). Outros dois ficaram feridos, um deles gravemente.
RFI: O posicionamento político dos combatentes do RDK levanta muitas questões. Nos canais do Telegram do Corpo de Voluntários Russos, um dos vídeos mostra duas pessoas que seriam difíceis de imaginar juntas na vida civil: um membro da ultradireita nacionalista, Alexei Liovkine, e um ex-ator e professor de ioga, anarquista, Kirill Kanakhine. Você pode traçar um perfil dos voluntários do RDK?
A.S.: Os voluntários não são necessariamente de extrema direita. E hoje há também o batalhão “Sibéria”, que recruta voluntários da esquerda e anarquistas em particular. É por isso que os voluntários podem escolher em qual divisão ingressar.
Uma das dificuldades que estamos enfrentando atualmente é permitir que voluntários localizados em um terceiro país se juntem a nós. Estamos trabalhando nessas questões com a ajuda do Conselho Civil.
Também fornecemos equipamentos, treinamento, transporte para os voluntários, ajudamos suas famílias e os próprios voluntários, já que eles não são remunerados.
O Conselho Civil é uma organização ampla, com participação de todos que estão prontos para lutar por sua pátria. É por isso que, nessa organização, os nacionalistas russos lutam ao lado de nacionalistas circassianos. Pessoas de esquerda ao lado de pessoas de direita, muçulmanos ao lado de ortodoxos, etc. Na Rússia, tem havido muita polarização e as pessoas estão sendo colocadas umas contra as outras. Desde que um homem não cometa um crime, ele tem o direito de pensar o que quiser. E a marginalização dos nacionalistas pela intelligentsia liberal levou alguns deles ao fascismo e ao nazismo. 
RFI: Como o Conselho Civil e os membros do RDK veem a Rússia, agora e no futuro?
A.S.: Nós, da coalizão do Conselho Civil, consideramos a Federação Russa um Estado falido. E seus líderes são criminosos de guerra e criminosos políticos. Uma de nossas principais tarefas é a criação de um tribunal independente. Estamos reunindo provas e preparando acusações.
Acreditamos que toda nação tem o direito à autodeterminação. Isso significa que todas as repúblicas e comunidades regionais e grupos étnicos devem ser livres para escolher entre independência, participação em uma federação ou confederação, autonomia etc.
Estamos convencidos de que os russos, como nação, também têm o direito à autodeterminação. E isso, entre outras coisas, pode ser um remédio contra o imperialismo e o colonialismo. Entretanto, nem tudo é tão simples. Existem muitas diferenças entre os russos.
RFI: Vocês têm um objetivo separatista?
A.S.: À medida em que Vladimir Putin já fez de tudo para desmembrar o país, o separatismo está do lado daqueles que são aliados do Kremlin. Assim que Putin desaparecer, eles dividirão o país em territórios para controlar.
RFI: Como vocês são financiados? 
A.S.: Representantes das comunidades regionais, nacionais e da diáspora nos ajudam financeiramente. Também coletamos doações de nossos apoiadores. Obviamente, esse financiamento é limitado e irregular. Alguns doam € 1.000, outros € 100, outros € 10.000. Os fundos coletados são destinados a treinamento e equipamentos.

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