‘Nunca imaginei’, diz proprietária de fazenda do RS onde fóssil pré-jurássico foi encontrado

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Maricilda da Silva Rodrigues diz se sentir feliz e honrada, além de ter se surpreendido com a descoberta. Pesquisadores da Unipampa identificam a região do estado como propícia para achados paleontológicos. Pesquisadores da Unipampa encontram crânio de animal mais antigo que dinossauro
Divulgação / Alice Dias
A recente descoberta de um fóssil de anfíbio gigante mais antigo que os dinossauros, por pesquisadores da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), surpreendeu Maricilda da Silva Rodrigues, proprietária da fazenda, em Rosário do Sul, onde a ossatura foi encontrada.
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“Nós demos a permissão para eles [pesquisadores] fazerem o estudo. Aqui na nossa propriedade é a primeira vez que é encontrado. Nunca imaginei. Muita honra para nós e, principalmente, para o nosso município”, comemora.
Além de proprietária do local com o marido, é técnica em agropecuária e, ao longo dos 30 anos em que mora na fazenda, e contou ao g1 que nunca imaginou que poderia existir no solo um fóssil dessa relevância. “Muito feliz com essa grande descoberta”, celebrou Maricilda.
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Apesar do achado ser inédito na propriedade, dado o tamanho do crânio do anfíbio, a equipe de paleontólogos envolvida na pesquisa conta ser comum encontrar fragmentos de ossos na área.
“Na fazenda, é como se tivesse uma janela para rocha da formação Sanga do Cabral. A gente chama de afloramento. A rocha que está embaixo do solo aflora em alguns lugares, por exemplo, num corte de estrada ou num açude de uma fazenda, que é o caso ali”, explica Voltaire Neto, pesquisador e doutor em paleontologia pela Unipampa.
Conforme esclarece o pesquisador, a característica da rocha indica a data aproximada do período originário do anfíbio.
Crânio do anfíbio gigante Kwatisuchus rosai
Divulgação / Felipe Pinheiro
“A formação Sanga do Cabral tem uma idade do Triássico Inferior e pega ali Rosário do Sul, Cachoeira do Sul, até quase Porto Alegre. Ela tá abaixo das rochas que abrigam os dinossauros, uma outra formação rochosa: a formação Santa Maria. Ela abriga os dinossauros mais antigos do mundo. A Santa Maria aflora, então, na região mais central do Rio Grande do Sul, entre Santa Maria até Venâncio Aires. E na faixa Oeste, passando por Candelária”, diz Voltaire.
O afloramento de Sanga Cabral na fazenda de Maricilda foi um achado do paleontólogo da Universidade Federal de Santa Maria, Átila Stock Da-Rosa. Posteriormente, em homenagem a ele, o crânio fóssil identificado no local recebeu o nome de Kwatisuchus rosai.
Kwatisuchus rosai
Reconstituição do anfíbio gigante Kwatisuchus rosai em seu hábitat
Divulgação / Márcio Castro
O grupo de pesquisadores da Unipampa de São Grabriel localizou a ossatura em agosto de 2022, na propriedade de Rosário do Sul. Com frequentes idas à fazenda, autorizadas pela proprietária Maricilda, a pesquisa de campo foi se desenvolvendo até que fosse possível concluir a datação do crânio.
Somente após recente análise, envolvendo etapas de limpeza e desacoplamento do fóssil da rocha, avaliação documental, coleta de dados e registros, os cientistas puderam concluir que o animal viveu há, aproximadamente, 250 milhões de anos na Terra, anterior à presença dos dinossauros.
Reprodução digital de como seria o anfíbio
Divulgação / Márcio Castro
“Uma coisa importante de lembrar é que o Kwatisuchus rosai viveu num momento pós-extinção em massa. Então, os continentes estavam todos juntos (Pangeia). Nesse período, acabou de acontecer a maior extinção que já dizimou a biodiversidade terrestre” , pontua Voltaire Neto.
Ele explica que o anfíbio não viveu a extinção em si, mas descendeu de sobreviventes dessa fase.
As contribuições dessa descoberta paleontológica podem ser úteis para compreender o ecossistema da Pangeia.
Os pesquisadores tentam entender ainda se estão “vendo uma fauna e uma flora que estão se dando bem na crise, digamos assim, ou se, realmente, fazem parte de um contínuo, que não vai ter uma transição marcada. Se vai ser um contínuo entre o que aconteceu e o que vai vir depois”, diz o cientista.
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Em setembro de 2023, no interior de São Gabriel, pesquisadores da Unipampa em parceria com a Universidade do Piauí e a Universidade Harvard encontraram o mais antigo predador terrestre do continente. É o Pampaphoneus biccai, que viveu há mais de 265 milhões de anos.
“O fóssil foi encontrado em rochas do Permiano médio, em um local onde os ossos não são tão comuns, mas que sempre guarda gratas surpresas. Encontrar um fóssil como esse envolve sempre muito esforço”, relembra Mateus Costa Santos, biólogo e pesquisador da Unipampa.
Pesquisadores em trabalho de campo em São Gabriel
Divulgação / Felipe Pinheiro
O Pampaphoneus viveu pouco antes da maior extinção que a vida na Terra já testemunhou. No evento, cerca de 90% de toda a existência no planeta foi dizimada.
Um dos principais grupos de grandes animais que prosperaram antes da extinção é o dos dinocefálios. Segundo os pesquisadores, tratavam-se de animais de médio a grande porte com representantes carnívoros e herbívoros.
Reconstrução digital do Pampaphoneus biccai
Divulgação / Márcio Castro
De acordo com os estudos, esse animal tinha ossos cranianos espessos, ocasionando no nome do grupo: dinocefálio, em grego, cabeça terrível.
Embora bem conhecidos na África do Sul e na Rússia, eles são incomuns em outras partes do planeta. No Brasil, a Pampaphoneus biccai é a única espécie conhecida.
O grupo da Unipampa, ao longo do projeto realizado no Laboratório de Paleobiologia do campus de São Grabriel, já identificou outras ossaturas pré-históricas.
Ossaturas encontradas por pesquisadores da Unipampa no RS
Divulgação / Felipe Pinheiro
Entre as ossaturas estão a do Kwatisuchus, de Rosário do Sul, e as de Sangaia (um ritidosteídeo), encontrado em Cachoeira do Sul, Tomeia (um capitossauro), em São Francisco de Assis, e um dissoforóideo indeterminado (que parece um “bumerangue”), em Santa Maria. “Todos eles fósseis de anfíbios”, esclarece Voltaire Neto.
Teyujagua paradoxa
Reprodução do réptil achado em São Francisco de Assis
Divulgação / Márcio castro
O esqueleto de um réptil “do tamanho de uma raposa e parente dos dinossauros” também foi identificado pelos cientistas e estava com os ossos bem preservados.
Ele foi achado há sete anos, no “afloramento chamado Bica São Tomé, em São Francisco de Assis”, destaca Tiane Macedo de Oliveira, paleontóloga e doutora em biodiversidade pela UFSM.
Pesquisadora Tiane Macedo de Oliveira analisa fragmento de fóssil encontrado no RS
Divulgação / Felipe Pinheiro
“Encontrado em 2016, crânio foi descrito pelo professor Felipe Pinheiro (Unipampa) e colaboradores. Um novo material foi achado em 2018. Agora temos o material fóssil quase completo dele”, comenta a paleontóloga.
Esqueleto encontrado em São Francisco de Assis.
Divulgação / Felipe Pinheiro
Ela ainda menciona que a divulgação científica sobre o réptil é recente, pois o tratamento do material exige “preparação mecânica. É uma rocha muito resistente com um fóssil muito delicado”.
Denominado Teyujagua paradoxa, ele é um dos esqueletos mais completos já achados na América do Sul, segundo pesquisadores.
Quarta Colônia
Espécies pré-históricas descobertas no RS nos últimos dois anos
Divulgação
Desde 2021, o Rio Grande do Sul é destacado pelo livro dos recordes Guinness como a terra dos dinossauros mais antigos do mundo. A região conhecida como Quarta Colônia, que fica no Centro do estado, é rica em patrimônio paleontológico, com rochas que remontam ao período Triássico, armazenando espécies animais e vegetais que ajudam a recontar a história do planeta Terra.
Em 2023, a Quarta Colônia foi reconhecida pela Unesco como geoparque mundial. Integram o geoparque as cidades de Agudo, Dona Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá, Nova Palma, Pinhal Grande, Restinga Seca, São João do Polêsine e Silveira Martins.
As descobertas na região do pampa e em outras áreas do RS ampliam a popularização da ciência e do conhecimento sobre ecossistema e fósseis no estado.
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